(AO) Avaliação de Desempenho Docente e as aulas assistidas

Uma reflexão sobre a (in)utilidade das aulas assistidas como ferramenta da avaliação de desempenho docente

Acabei de chegar do Seminário Práticas de Avaliação de Desempenho Docente (ADD) na Universidade de Braga. Todos os oradores que se pronunciaram sobre as aulas assistidas como ferramenta de ADD, inclusive os professores avaliados que estavam na plateia (alguns destes denunciando alguma desconfiança) foram de opinião (sublinho: opinião) que são úteis, mas sempre iam dizendo que “duas aulas assistidas não servem para fazer nada” (Antonieta Mamede, esta colega com 40 anos de experiência docente como a própria afirmou – deve ter contabilizado o tempo de catequista) ou que “existem professores que usam pela primeira vez as TIC nas aulas assistidas” (Álvaro Almeida Santos). Ou seja, eles próprios, defensores das aulas assistidas, apontavam as razões da inutilidade dessa forma de avaliação. Se duas aulas assistidas não servem para nada, quantas serão necessárias? Dez? Sessenta? Um professor no início da carreira não aguentaria a pressão e um professor no topo não se sujeitaria. E se os professores usam estratégias nas aulas assistidas que normalmente não usam em aulas normais as primeiras têm de ser vistas como mais teatrais (ver http://revistaensinareaprender.blogspot.com/2008/02/ao-aulas-assistidas-est-aberta-poca-do.html ). Os professores se souberem que vão ser avaliados preparam-se antes, ensaiam, encenam, avisam os alunos,… enfim, teatralizam. Uma colega da plateia ainda sugeriu que as aulas assistidas deveriam acontecer sem qualquer aviso prévio. Ora, se acontecesse comigo, rezaria, apesar de não ser crente, para que essa observação calhasse numa das minhas turmas bem comportadas, rezaria para que calhasse numa das matérias em que consigo motivar melhor os alunos, rezaria para que todos os alunos nesse dia tivessem o material necessário para essa aula, rezaria que não calhasse nas aulas dos meus alunos CEF, rezaria, rezaria,… Parece-me assim que as aulas assistidas ou são teatrais ou estão dependentes do valha-me deus.
Falou-se ainda da legitimação dos avaliadores. Pois! Quem nos avaliaria? Numa aula duas componentes são colocadas em jogo: a científica e a pedagógica. O avaliado reconhecerá competências ao avaliador nestes dois domínios? Para este ser aceite sem contestação as suas habilitações académicas teriam de ser superiores em cada um desses domínios e se fossem iguais o avaliador teria de ter mais experiência. Estas seriam, na minha opinião, as condições necessárias para se poder avançar para o passo seguinte: a aceitação do avaliador por parte do avaliado. Podem anda existir conflitos relacionais, ou até excesso de afetividade, não notados pelo diretor.

Os professores acabam por aceitar um determinado avaliador porque se sentem obrigados a aceitá-lo. Nos bastidores das escolas parece-me claramente pairar a imagem que os professores não concordam com a observação das aulas. Alguns pedem-nas mas, provavelmente, os motivos prendem-se com um certo sentimento de fidelidade normativa receando ficar prejudicados na progressão, ou mesmo, até, devido ao “medo” e à “tensão” que, como disse a Maria Martins, existe nos professores.
O modelo de ADD, na minha opinião, deve ser sempre negociado com os professores através de um contrato de avaliação elaborado em conjunto pelo avaliado e avaliador. Este deve ter mais habilitações académicas que o avaliado e se as tiver iguais deve ter, obrigatoriamente, mais tempo de serviço (podendo considerar-se como mais experiente). Deve ser aceite pelo avaliado mas com a respetiva ratificação do diretor devendo este analisar eventuais casos de excesso de proximidade ou o contrário. Nesse contrato não teriam lugar os objetivos referentes às taxas de abandono escolar e outras do género pois os alunos, e todas as suas características humanas/sociais criadas com a nova turma no início, só serão realmente conhecidas no final do ano fazendo com que os pretensos objetivos definitivos apontados no início do ano não passem de mais uma incompreensão.

Lembrei-me de um modelo de ADD que poderia ser aplicado aos professores: usar o mesmo que é usado nos professores do ensino superior (não há polémica). Quero salientar com esta ironia uma outra incompreensão: não me parece que o mesmo modelo sirva eficazmente e simultaneamente os educadores de infância, ou mesmo os professores do 1º ciclo/2ºciclo, e os professores do ensino secundário.

Luís Ricardo (2011)

(AC) Investigação-Ação (I-A) vs Estudo de Caso

Uma reflexão sobre as diferenças e semelhanças entre I-A e um Estudo de Caso

Simões (1990) refere que “na maior parte dos casos, a I.-A. assumirá a forma de estudo de caso” (idem:47). Como existem outras referências semelhantes por parte de vários autores denunciando que poderá existir algum conflito entre os dois conceitos, levou-me a apresentar esta reflexão.
Considerando a I-A como um conjunto de procedimentos para dar resposta a um problema social, real e específico vivido/sentido pelo investigador/profissional, colocando-se em ação os resultados duma investigação no sentido de melhorar a sua prática num processo cíclico, refletivo e crítico onde o grupo alvo tem de assumir a aceitação das mudanças e envolver-se ativamente em todo o processo (lá estou eu a repetir esta definição), e um estudo de caso como uma investigação particular, descritiva, heurística, indutiva… ou  como um método que “consiste na observação detalhada de um contexto (...) ou de um acontecimento específico” (Merriam, 1988, cit. Bogdan & Biklen, 1994:89) procurarei aqui resumir as que me parecem ser as suas diferenças/semelhanças principais.

Tab. 1 – I-A vs estudo de caso
I-A
Estudo de caso


Levado a cabo por um profissional/ investigador (ou por um conjunto de investigadores/profissionais)

Não necessariamente, mas nada o impede.

O grupo alvo tem de ter conhecimento do processo e participar nas actividades aceitando as mudanças.

Não necessariamente, mas nada o impede.
Implica um processo cíclico numa procura de melhorar constantemente a prática do profissional/investigador aplicando-se os resultados no grupo/alvo investigado.

O estudo conclui-se no final de uma investigação, encerrando-se o ciclo. Nada garante que os resultados da investigação sejam aplicados (muitas teses de doutoramento e mestrado nunca saíram da prateleira – como sabemos).

Debruça-se sobre um problema social.

Não necessariamente, mas nada o impede.


Não é generalizável (não existe validade externa)

Não é generalizável tal como a I-A.

Não se vislumbram meios eficazes para provar a sua validade interna.

Tem validade interna.
Referências bibliográficas
·         Bogdan, R., Biklen, S. (1994). Investigação Qualitativa em Educação. Porto: Porto Editora
·         Simões, A. (1990). A Investigação-Acção: Natureza e Validade. Coimbra: Universidade de Coimbra, Revista Português de Pedagogia, Ano XXIV, pp. 39-51


Luís Ricardo (2011)

(AO) A cozinha e a Investigação-Ação (I-A)

Uma reflexão sobre uma profissão paradigmática no que respeita ao entendimento da I-A

Durante a elaboração de um cozinhado e depois da refeição reparei que o prato que costumo elaborar nunca é feito da mesma maneira pois procuro sempre acrescentar/retirar, sempre que o faço, um ou outro ingrediente no sentido de o melhorar depois de fazer a respetiva prova e ouvir a opinião dos destinatários.
Lembrei-me de um amigo meu cozinheiro, que trabalha numa cantina, que nunca deixou de passar nas mesas perguntando aos comensais se gostaram da comida. Como é meu amigo não lhe dizia somente que tinha, ou não, gostado mas sugeria-lhe algumas mudanças no sentido de me satisfazer melhor na próxima refeição. Ora o chef mudava sempre a receita acrescentando ou retirando, enfim, afinando a receita e lá estava ele de novo, percorrendo algumas mesas, a fazer a sua avaliação aos resultados. O certo é que essa cantina era um dos meus “restaurantes” preferidos e provavelmente o cozinheiro nunca ouviu falar de I-A.

Esta postura do profissional, à semelhança do professor, enquadra-se, na minha opinião, do que se espera da I-A mesmo que se faça de uma forma inconsciente. A inconsciência do ato, ou seja a sua não intencionalidade, só não permitiria que se considerassem os resultados obtidos como uma inovação. Ora, da I-A não se espera inovação (embora também nada o impeça), mas sim mudança numa perspetiva de melhoria. Inovação implica mudança mas mudança não implica inovação. A ajudar esta pretensão de colocar o trabalho do meu amigo como integrado num processo de I-A, Tripp (2005:445) refere que “ é pouco provável que algum dia venhamos a saber quando ou onde teve origem esse método, simplesmente porque as pessoas sempre investigaram a própria prática com a finalidade de melhorá-la”.

Assim, considerando a I-A como um conjunto de procedimentos para dar resposta a um problema social, real e específico vivido/sentido pelo investigador/profissional, colocando-se em ação os resultados duma investigação no sentido de melhorar a sua prática num processo cíclico, refletivo e crítico onde o grupo alvo tem de assumir a aceitação das mudanças e envolver-se ativamente em todo o processo (esta é a minha definição preferida até ao momento), parece-me que a profissão de cozinheiro emerge como uma das paradigmáticas no que respeita ao entendimento da I-A.

Referência bibliográfica
·          Tripp, D. (2005). Pesquisa-ação: uma introdução metodológica. São Paulo: Revista Educação e Pesquisa, v. 31, n. 3, set./dez. p. 443-466

Luís Ricardo (2011)

(AO) Investigação-Ação (I-A) feita pelo professor/investigador numa escola portuguesa

Uma reflexão sobre a dificuldade de implementação da I-A nas escolas portuguesas
Sabemos que a I-A poderá ir para além da educacional tal como sabemos que poderá extravasar a principal função (das inúmeras conhecidas e cada vez mais) do professor, que é ensinar. No entanto, e tendo em conta estes pressupostos, parece-me que a sala de aulas se elege como o local de excelência para aplicar o processo de I-A numa escola. Surgem assim algumas interrogações sabendo-se, no entanto, que algumas só poderão ser respondidas após a identificação do problema em concreto e/ou no decorrer do processo:
1. Quais os objetivos que podem ser considerados pertinentes e convincentes a incluir no processo de I-A que se pretende desenvolver no sentido de melhorar a prática profissional especifica e particular?
2. Que registos e solicitações terão de se realizar como forma de credibilização do processo para o poder assumir perante os restantes professores (penso que a comunidade escolar será demasiado abrangente e a chamada comunidade educativa ainda mais despropositada para a discussão deste tipo de atividades) como sendo uma I-A?
3. Como informar e convencer a comunidade dos líderes intermédios da escola que se pretende desenvolver um processo destes sabendo-se que a sua grande maioria tem somente experiência de ensino e poucos conhecimentos nestes domínios?
4. Como o professor/investigador adquire as horas necessárias no seu horário semanal para poder realizar o processo sabendo que o tempo do professor está super ocupado devido à rigidez dos currículos, sobretudo os que são sujeitos a exames nacionais, e super preenchido com atividades de projetos preestabelecidas no início do ano letivo?
5. Partindo do pressuposto que são necessários esses registos, onde se deverão arquivar, numa atitude necessariamente burocrática (e útil, na minha opinião), caso, por exemplo, o objeto de estudo esteja na turma que o professor/investigador leccione? No PEE? No PAA? No PCT? No PCE? Em todos?
6. Que postura ética se deverá tomar perante os sujeitos/alunos sabendo-se que estes têm também de participar ativamente e conhecer claramente os objetivos do estudo se, por exemplo, existir necessidade de “vasculhar” os processos individuais de cada aluno sabendo-se que os professores estão obrigados ao sigilo profissional perante os outros alunos?
7. Que fases/etapas se deverão utilizar no processo tendo em conta a posição epistemológica que existe perante o problema identificado? Quais as etapas que se deverão “saltar”?
8. Como aplicar os conhecimentos resultantes da investigação no sentido de mudar a prática?

Luis Ricardo (2011)

(AC) Investigação-Ação (I-A) ou Pesquisa-Ação (P-A)?

Uma reflexão sobre as diferenças entre os dois termos
Um dos problemas que me parecem sobressair, aliás como em muitas temáticas da área das Ciências da Educação, é a quantidade de termos existentes para o mesmo significado. Tudo poderá passar para um melhor entendimento por uma delimitação dos conceitos podendo, até, e na minha opinião, “qualquer” termo servir. Nesta área debatemo-nos com expressões abrangentes como Investigação-Ação (I-A) mas muitas vezes lemos em sua substituição Pesquisa-Ação (P-A) sobretudo vindo de autores brasileiros. Grabauska & Bastos (1998) tiveram o cuidado de acrescentar no final do artigo que os termos I-A e P-A foram utilizados como sinónimos no seu trabalho, fazendo, deste modo, que o texto que apresentaram ficasse fluído e facilmente entendível.
No entanto Tripp (2005) pensa de uma forma diferente ao afirmar claramente que a P-A é um tipo de I-A entre inúmeros tipos ou “entre alguns dos diversos desenvolvimentos do processo do processo básico de investigação-ação” (idem: 446). Este professor da Universidade de Murdoch (Austrália) apresenta o objetivo principal do seu contributo como um esclarecimento do termo pesquisa-ação dado o seu uso ambíguo dizendo até que é usado duma forma “vaga e (…) sem sentido” (idem:447). No entanto poderíamos contrariá-lo nessa tentativa de clarificação uma vez que os termos que utiliza não distinguem pesquisa de investigação e sabemos que poderá neste aspeto criar algumas confusões de análise já que pacificamente se tende a ligar pesquisa ao passado e investigação ao futuro.
Embora me pareça que o processo da I-A possa conter pesquisas, por exemplo, ao passado biográfico dos sujeitos em estudo numa perspetiva antropológica/psicológica/sociológica com o objetivo de os compreender e melhorar uma determinada prática profissional do professor/investigador/pesquisador. E poderá, no meu entender, ser suficiente para se completar um ciclo/espiral do processo contínuo. Aliás uma das primeiras tarefas do professor diretor de turma é precisamente a análise documental dos registos documentais existentes de todos os seus alunos, apresentando os problemas identificados (e não costumam ser poucos) aos restantes elementos do conselho de turma com o único objetivo de melhorar as ações educativas e específicas de cada disciplina. Não será este procedimento o início de uma I-A embora processada inconsciente pela maioria dos professores? Parece-me claramente que sim. Franco (2005) trata o termo P-A nitidamente como de I-A se tratasse parecendo-me, por estes motivos, que, não existindo qualquer alerta no sentido de delimitar os conceitos como o fez Tripp (2005), possam ser entendidos da mesma forma.
Em Lima (2011) a pluralidade de visões (nesta obra dedicada em exclusivo às várias perspetivas de análise da organização escolar) são vistas como vantajosas pois permitem um fortalecimento teórico mas simultaneamente denunciantes de alguma imaturidade analítica. Esta guerra de tentativas por parte dos autores de acrescentar mais faces ao prisma teórico, com cada autor a tentar encontrar e caraterizar vários tipos, variedades, modalidades, ou seja, várias concetualizações de I-A, embora repetidas muitas vezes dentro das diferentes denominações, parecem-me de facto importantes pois permitem-nos obter muitas óticas reflexivas mas, também me parece, que exageramos um pouco se pensarmos na perspetiva da segunda rutura epistemológica (referida e mais que batida ideia de Boaventura Sousa Santos) ou na perspetiva do duplo paradoxo de Costa, Ávila & Mateus (2002).

Referências bibliográficas
• Costa, A. F., Ávila, P., Mateus, S. (2002). Públicos da Ciência em Portugal. Lisboa: Gradiva
• Franco, M. A. S. (2005). Pedagogia da Pesquisa-Ação. São Paulo: Revista Educação e Pesquisa, v.31, n.3, p.483-502
• Grabauska, C. J., Bastos, F. P. (1998). Investigação-acção: possibilidade crítica e emancipatória na prática educativa. Revista Electrónica de Investigación Curricular y Educativa, v. 1, n. 2
• Lima, L. C. (org.) (2011). Perspectivas de Análise Organizacional das Escolas. Vila Nova de Gaia: Fundação Manuel Leão
• Tripp, D. (2005). Pesquisa-ação: uma introdução metodológica. São Paulo: Revista Educação e Pesquisa, v. 31, n. 3, set./dez. p. 443-466

Luis Ricardo (2011)