(AO) O que gostaria de saber (II)

O que pensarão os professores da avaliação docente?

O profissional professor tem de ser avaliado no seu desempenho. Parece ser a opinião generalizada do público. A recente mudança na forma de o tentar fazer denuncia uma vontade dos políticos em melhorar esse processo com o intuito aclamado de se obterem resultados mais justos, melhorar a qualidade na educação e provavelmente impedir a progressão de todos, naturalmente, sob uma visão economicista.
Na perspectiva de Mintzberg (1999) a organização Escola (unidade) pode incluir-se num modelo organizacional tipo “burocracia profissional” onde os elementos do centro operacional, ou seja, os professores, controlam o seu próprio trabalho. Retira-se também que é muito difícil avaliar os profissionais nesse tipo de organização, excepto no que respeita aos procedimentos administrativos e à actualização de conhecimentos. De facto, se fossem só estes dois itens a avaliar tornaria a avaliação docente muito fácil, pois tratam-se de critérios claramente objectivos. Também já se escreveu que a sala de aulas é vista como uma “caixa negra” do sistema (o professor Ricardo Vieira costuma(va) até dizer que é toda a Escola). Neste sentido, reconhece-se que não se consegue fazer uma justa e eficaz avaliação na observação de uma, duas, ou mesmo mais aulas, pois as aulas “não-observadas” são diferentes das “observadas”. Estas são mais teatrais e o observador não consegue disfarçar-se de armário a fim de não provocar constrangimentos e enviesamentos aos resultados dessa observação. Sabemos também que não temos profissionais formados para supervisionar os professores que se encontram no decurso da sua carreira (de notar que este tipo de supervisão a que me refiro, nada tem a ver com o significado que o termo sugere - ver, Alarcão e Tavares, 1987). Sabemos ainda que os professores mais experientes, os que normalmente são avaliadores, nem sempre (quase nunca) têm mais habilitações académicas ao nível científico e/ou pedagógico e/ou administrativo do avaliado. Que imbróglio!
Sabendo-se tudo isto, só não sabemos o que pensam os professores sobre a forma como querem ser avaliados. Qual será a melhor forma de avaliar os professores do 2º, 3º ciclo e secundário que se encontram no decurso da sua carreira na perspectiva dos próprios? Será que para eles a observação de aulas é eficaz/importante nessa avaliação? Será que querem ser avaliados na componente científica? E na pedagógica? E na administrativa/organizacional? E numa componente sócio-afectiva/participativa? E como querem ser avaliados em cada uma dessas componentes? Quais os itens? Quais os pesos em cada item? Ou preferem ser avaliados com base nos resultados escolares dos seus alunos? E com que referências? Os do ano anterior à mesma disciplina? E será que os professores concordam que o avaliador tenha habilitações inferiores a eles nas dimensões cientificas, pedagógicas, administrativas/organizativa e social/humana? Quem na opinião dos professores deve vestir a pele de avaliador (ou relator, ou supervisor,… o nome pouco interessa)? Quem deve progredir na sequência dessa avaliação? Como se deve progredir? E quando?
Sou professor e só conheço a minha opinião. Estas perguntas têm certamente respostas e, essas respostas, deveriam servir de base para se escolher o modelo concertado para a tão polémica e pouco eficaz avaliação docente.

Referências bibliográficas
· ALARCÃO, Isabel; TAVARES, José – Supervisão da Prática Pedagógica – Uma perspectiva de desenvolvimento e aprendizagem. Coimbra: Livraria Almedina, 1987
· MINTZBERG, Henry – Estrutura e Dinâmica das Organizações. Alfragide: Publicações D. Quixote, 1999

Luís F. F. Ricardo (2010)

(AC) Supervisão Pedagógica - à procura de uma objectividade

Este trabalho pretende provocar uma reflexão sobre as inegáveis vantagens da supervisão pedagógica mas também sobre toda a sua problemática numa perspectiva de um melhor entendimento do conceito e dos outros que lhes estão relacionados, como, por exemplo, liderança e regulação. Abordam-se as diferenças da supervisão no que respeita ao supervisionado, pois pode ser dirigida ao candidato a professor e/ou ao professor já em carreira e analisam-se as formas e as dimensões dessa supervisão, bem como os estilos que o supervisor poderá, ou deverá, assumir. Surgem neste seguimento as naturais dúvidas sobre a eficácia na sua implementação nas escolas portuguesas (3º ciclo e secundário) direccionada aos professores em pleno exercício tendo em conta a suposta homogeneidade da classe docente. Procuro também propor algumas das soluções que, na minha perspectiva, poderiam ajudar nessa implementação.



Introdução
O conceito tem estado muito em voga desde que, provavelmente, a professora Isabel Alarcão se debruçou sobre ele há aproximadamente duas décadas em Portugal. O termo, um pouco duro, sugere vários significados mas pretende ser quase tudo menos o que aponta. Daí a importância de o analisarmos e tentarmos verificar a sua implementação nas escolas portuguesas. Pode ser visto em duas grandes áreas de aplicação: o dirigido a candidatos a professores e o dirigido a professores já em carreira. É neste último aspecto que me interessa aprofundar o estudo pois parece-me o mais problemático e, até, diria, baseado na observação diária que faço na Escola, que não se aplica conforme os diversos autores a caracterizam.



1- Delimitação do conceito
Como a maioria dos conceitos que giram em torno da Educação, o termo supervisão neste contexto não tem uma só definição nem tem sido estática (Harris, 2002, cit. Prates, Aranha e Loureiro, 2010). A professora Ivone Gaspar[1] alerta-nos dizendo-nos que “É comum identificar a supervisão com a orientação da prática pedagógica, mas, na realidade ultrapassa, largamente, este âmbito. Importa trabalhar a conceptualização deste termo, no pressuposto que ele acentua a dimensão de processo”. Mas, em qualquer área, o termo supervisão está, certamente, conotado com inspecção e controlo ao contrário de como pretende ser percepcionado nas escolas: uma espécie de coach numa perspectiva de ajudar o supervisionado a trilhar o seu próprio caminho de desenvolvimento. Sugere ainda, numa análise ligeira, uma relação hierárquica entre o supervisor e o supervisionado.
Poderá também ser vista como possuir uma visão muito melhor que a normal (super-visão). Numa perspectiva organizacional pode ser considerada como uma habilidade/competência de análise do passado, análise do presente e análise, prevendo, o futuro.
Neste seguimento as ligações mais imediatas que se vislumbram na escola atual é a relação existente entre o coordenador pedagógico e o professor do seu círculo curricular, entre o professor relator e o professor avaliado no seu desempenho e entre o acompanhante do estágio e o respectivo candidato a professor. Esta ligação entre supervisão e avaliação não constitui surpresa pois até algumas instituições do ensino superior oferecem cursos pós-graduados nesse sentido com nomes que não deixam dúvidas quanto a essa ligação. Alarcão e Tavares (1987) também dedicam algumas considerações a esta ligação sugerindo critérios e modos de observação.
Vieira (2009) apresenta uma definição onde não deixa dúvidas sobre o objectivo da supervisão: “teoria e prática de regulação de processo de ensino e de aprendizagem em contexto educativo formal, instituindo a pedagogia como o seu objecto” (idem, p. 199). Soares (2009) sugere ainda, baseada na evolução da legislação e do estudo de diversos autores, como função de supervisão, uma orientação no sentido de ajudar o professor supervisionado a desenvolver a sua carreira, estimulando o seu desempenho também através de uma forma reflexiva, exercendo, deste modo, uma influência indirecta na aprendizagem dos alunos e consequentemente na qualidade da educação – pois, parecerá bem a todos que deverá ser este o cerne principal de toda a dinâmica das inovações criadas nos sistemas educativos.
Sem qualquer receio de serem criticadas, Leal e Henning (2009) aplicam termos na supervisão pedagógica (ou escolar, como lhe chamam) como vigiar, examinar, fiscalizar, corrigir, indagar, comparar e duvidar, contrariando a evolução do conceito como até elas referem ao dizerem que existiu uma primeira fase mais autoritária e uma segunda fase (a atual) mais humanizada. Mas na defesa destes termos que reconhecem poderem ser vistos como “profundamente negativos” recorrem a Foulcault (aliás, recorrem a este filósofo várias vezes) ao citá-lo desta forma:
“temos que deixar de descrever sempre os efeitos de poder em termos negativos: ele exclui, reprime, recalca, censura, abstrai, mascara, esconde. Na verdade o poder produz; ele produz realidade, produz campos de objetos e rituais de verdade” (Foulcault, 2006, cit. Leal e Henning, 2009, p. 253).

Com o suporte da minha prática enquanto professor (mais de 20 anos) e ajudado por Bourdieu (1992, cit. Vieira, 1999, p. 79)[2] que diz,
“(...) nunca parei de me tomar como objecto, não no sentido narcísico, mas enquanto representante de uma categoria (…) na medida em que analiso categorias às quais eu pertenço; logo, falando de mim mesmo, eu digo a verdade dos outros por procuração”,

associo as funções de supervisão, considerando os diversos cargos existentes na unidade Escola, ao sentido mais imediato do termo, ou seja, às incluídas nas funções dos coordenadores de departamentos curriculares e dos coordenadores pedagógicos dos grupos (como já referi em cima). Podemos chamar-lhe supervisão hierárquica, ou coordenação, para um melhor entendimento, mas sem o ser, pois, na verdade, quem tem exercido esses cargos na escola é um qualquer professor duma forma rotativa com tendências a todos fugirem dessas tarefas pela obrigatoriedade de terem assento em vários órgãos comprometendo-lhes, por exemplo, as quartas-feiras de tarde livres. Ou seja, não podemos, aqui, falar de qualquer estilo ou forma de supervisão, nem da maneira como era vista nem da maneira como queremos que seja vista. Agora, no entanto, o DL nº75/2008, de 22 de Abril, atribui essas competências aos coordenadores (além de dar poderes ao Director da Escola na escolha desses lideres intermédios – chamemos-lhe assim). E aqui a influência destes responsáveis, se assumirem as tarefas supervisivas que lhe estão agora inerentes, já poderá de algum modo alterar este vislumbre. É esta a perspectiva que percepciono também nos restantes professores no ensino do 3º ciclo e secundário no que respeita a este conceito em estudo, ou seja, não existe supervisão como é apresentada na diversa literatura.
Como já referi, as dimensões da supervisão pedagógica são as que fornecem uma orientação da prática docente ao professor através de uma monitorização contínua e a que fornece uma orientação na formação ao candidato a professor na sua formação de base (como terá surgido o conceito) numa perspectiva de “ensinar os professores a ensinar” (Alarcão e Tavares, 1987, p. 34). A maioria dos autores estudados não fazem uma diferenciação muito clara nas diferenças de estilo dessas duas dimensões e aplicam na sua caracterização geral termos mais consensuais e abrangentes como, por exemplo, que a ação supervisiva deverá ser reguladora e formativa, fazendo deste modo com que, em qualquer das dimensões, se adeqúem perfeitamente a essas características. No entanto, por exemplo, Vieira (2009) e Alarcão e Tavares (1987) incidem claramente as suas análises à supervisão que é feita ao candidato a professor, pois é onde se sentem mais à vontade por terem já tido a experiência de formar professores.
Existem assim definições muito alargadas como a que define Alarcão (2009, p. 121) ao dizer que “todos na escola são supervisores” no sentido que todos têm o dever de se “inter-ajudarem e de contribuírem para uma escola melhor” definindo, neste contexto, vários tipos de supervisão como, por exemplo, auto-supervisão e hetero-supervisão, ou considerando “a supervisão como um processo de criação de contextos de aprendizagem” (idem, 125) sem definirem quem são, ou quem deverão ser, de facto, os supervisores institucionais, embora, Alarcão (in Rangel, 2001), destaque a “inserção desse profissional no colectivo dos professores” (conforme refere Rangel na apresentação da autora) sugerindo, deste modo, a necessidade da existência de uma figura devidamente profissionalizada. Alarcão e Tavares (1987) também destacam o perfil do supervisor finalizando essa obra fazendo uma ligação da supervisão pedagógica a uma prática continuada de entre-ajuda nos professores sem a existência de uma avaliação no intuito de se proporcionar uma hetero e uma auto-supervisão.
É esta supervisão pedagógica contínua no trabalho do professor já formado do 3º ciclo e secundário nas escolas públicas portuguesas que pretendo desenvolver aqui neste trabalho.

2- Emergência
A ideia da supervisão partiu certamente da necessidade de um melhor acompanhamento de estágio aos novos professores ou a candidatos a professores. Alarcão (in Rangel, 2001) confirma esse início nos anos 70 acrescentando que se necessitava, nesse contexto, de uma fiscalização, controlo e avaliação. Evoluiu provavelmente para uma tentativa de retirar o professor da “caixa negra” que muitos chamam à sala de aulas de modo a que haja uma interacção colaborativa e transparente em toda a Escola. Parece ter havido uma necessidade do professor se libertar do seu isolamento através desta nova estratégia com as acções relacionadas com a supervisão pedagógica contínua não permitindo que o professor se conforme com o seu trabalho obrigando-o a prestar contas duma forma assídua e, duma forma partilhada, melhorando constantemente o seu desempenho. Seria esta a pretensão. Mas o termo surge na era da industrialização numa perspectiva do melhoramento qualitativo e quantitativo da produção (Lima, in Rangel, 2001).

3- Tipos e enfoques
Alarcão (1999, cit. Santos et al, 2008) sugere quatro enfoques: enfoque formativo, enfoque operativo (proporciona melhor instrução), enfoque investigativo (promove a reflexão), enfoque consultivo (o que orienta e aconselha).
Duffy (1998, cit. idem) apresenta quatro ideologias representando a evolução da supervisão mas tendo sempre em vista a promoção e melhoria do desempenho profissional do professor, que apesar de não possuir semelhanças com a realidade portuguesa pode-se retirar dessa análise outras reflexões sobre outros tipos e modos de fazer supervisão: período de inspecção administrativa (onde os supervisores eram autoritários e pertencentes a entidades morais que faziam um papel de fiscalização ao trabalho do professor), período de orientação para a eficiência (orientava-se para uma melhor eficácia da organização), período de esforço cooperativo de grupo (incentivava-se a cooperação entre todos) e período de orientação para a pesquisa/investigação (com os mesmos preceitos de uma supervisão clínica).
Alarcão (in Rangel, 2001), por sua vez, faz referências a 6 abordagens: (1) artesanal - numa perspectiva mestre aprendiz, (2) comportamentalista - de natureza mecanicista e racional, (3) clínica - a sala de aulas é vista a principal ferramenta de observação, ou seja, visto como um laboratório, portanto muito redutora, (4) reflexiva com intenções formativa e dinâmica, (5) ecológica - que considera “as dinâmicas sociais e, sobretudo a dinâmica do processo sinergético da interação entre o sujeito e o meio que o envolve” (idem, p.19) e a (6) dialógica – valorizando-se o
“papel da linguagem no diálogo comunicativo, na construção da cultura profissional e no respeito pela alteralidade assumida na atenção a conceder à voz do outro e na consideração de supervisores e professores como parceiros na comunidade profissional” (ibidem, p. 19).

Este último estilo de supervisão pedagógica parece ser a que absorve o que de melhor as outras abordagens possuem e a que melhor se adaptará à organização Escola (unidade) tendo em conta a sua natureza democrática e colegial.

4- Regulação
O artigo de Leal e Henning (2009) é sem dúvida um bom contributo para se poder entender a supervisão pedagógica num contexto de regulação. Apesar de usarem termos fortes que poderão de certa forma chocar algumas sensibilidades como, por exemplo, afirmarem que “ao manter os professores regulados, a Supervisão Escolar contribui e reforça a fabricação de sujeitos dóceis e úteis” (idem, p. 253). Fica-se no entanto com a noção, na leitura desse artigo, da óbvia relação entre supervisão e regulação. Exaltam constantemente o necessário “poder disciplinar” que tem de existir na supervisão para se poder obter os resultados desejados onde se incluem as análises e as eventuais correções dos procedimentos realizados. Neste sentido falamos, então, de regulação. Vieira (2009, p. 200) também faz essa relação ao afirmar “que a supervisão permite a regulação da qualidade da pedagogia”.
Esse poder disciplinar, e aqui disciplinar tem o significado de método/controlo/ordem, promove também a autorregulação uma vez que a ação supervisora é interiorizada pelos sujeitos supervisionados produzindo esse efeito auto-regulador através da apreensão do discurso incitando-os duma forma automática a corrigirem-se e a manterem uma conduta profissional. As autoras chamam a estas sequências como sendo resultado dos “maravilhosos efeitos do poder disciplinar” (ibidem, p. 256). Seguindo este raciocínio, podemos no entanto afirmar que, com tantas maravilhas, a supervisão tem também um efeito suicida pois se bem implementada contribui para a sua inutilidade já que promove a auto-regulação sendo esta característica (a da regulação), provavelmente, a vertente com mais significado no que respeita aos resultados esperados (qualidade na educação) da ação supervisiva. No entanto as autoras chamam-lhe, habilmente, “economia do poder disciplinar” (ibidem, p. 261) e acrescentam que essas transformações no professor supervisionado não se dão repentinamente mas sim “sob a vigilância compreensiva e amorosa de um mestre” (Garcia, 2002, cit. ibidem, p. 258). Vieira (2009, p. 201) também enfatiza que a finalidade principal da supervisão acompanhada será ajudar os formandos [leia-se: candidatos a professores] a tornarem-se supervisores da sua própria prática e que, se isso não acontecer, falhou no essencial” - o parênteses é meu.
Não podia deixar de acrescentar, depois da análise ao engraçado mas reflexivo texto de Leal e Henning (2009), a citação que transcrevo a seguir e que penso que reflecte o pensamento das autoras com assumidas influências de Foulcault:
“Do sujeito livre ao indivíduo que se sujeita, somos como objeto desse poder do qual dependemos e nos sujeitamos à vigilância de alguém. Não há como escapar do poder das disciplinas que individualizam, regulam e modelam nosso jeito de ser humano, atingindo nossa interioridade e nossa conduta social. A sociedade tratou de criar instituições para os que apresentam comportamentos desviantes: prisões e manicómios são exemplos disso” (idem, p.262).

5- Características
No seguimento do raciocínio de todos os autores referenciados depreende-se que a supervisão traga aos elementos do centro operacional[3] da Escola desenvolvimento, partilha de conhecimentos e dúvidas, democraticidade, reflexão, investigação, aprendizagem, formação, aceitação da mudança, em suma, melhorias na prática docente. Pode, deste modo, afirmar-se que ser supervisor agora se confunde com um estilo de liderança partilhada através de empowerment, proporcionando poder e conhecimento, no que respeita às características do líder necessárias e certamente apreciadas numa Escola tendo em conta o seu regime democrático e colegial, pois, os órgãos existentes são todos colegiais (excepto o órgão singular, activo/controlo e representativo do Director que só por si constitui um órgão independente), ou seja, o presidente/líder/supervisor de uma assembleia, seja ela de turma, de departamento, ou outra, não tem qualquer poder deliberativo sobre os outros membros excepto no voto de qualidade.
Sugestionado por Glathorn (1984, cit. Santos e Brandão, 2006) que considera que a supervisão pode ser implementada sob 4 aspectos (clínica, desenvolvimento pessoal cooperativo, desenvolvimento auto direccionado e monitorização administrativa) diria que a supervisão deveria ter características de monitorização nas seguintes áreas:
(1) científica;
(2) pedagógica;
(3) administrativa/organizativa;
(4) humana/social/participativa.
Rangel (2001, p. 57) define três acções: “pedagógica, administrativa e de inspeção”, contrariando um pouco a evolução do conceito que retira o carácter inspectivo à prática supervisiva. Provavelmente a autora conhecedora da realidade brasileira quererá igualar o significado de inspecção a monitorização. Ou a inspecção aqui não terá a carga conectiva de avaliação/repressão como comummente se supõe. Mas os termos confundem-se e os conceitos diferem consoante o país. Nos EUA, por exemplo, aplica-se mais dirigida ao professor já no desenvolvimento da sua carreira do que ao candidato a professor e tem um carácter mais fiscalizador ao nível administrativo e de aplicações das inovações (Alarcão e Tavares, 1987) do que propriamente pedagógico.
Assim, concluiria este capítulo com o seguinte esquema resumo das tarefas da supervisão pedagógica e os itens a trabalhar:
De qualquer modo ressaltam imediatamente as dificuldades em se conseguir formar um supervisor que seja especialista em todos estes domínios e cujas competências não se encontrem diminuídas em relação às dos supervisionados. Parece-me ser este o grande problema da implementação da supervisão pedagógica nas escolas portuguesas.

6- Supervisor
No Instituto Nacional de Estatística existe um cargo cujos profissionais são chamados de supervisores. São os segundos responsáveis pela recolha da informação obtida pelos entrevistadores. Orientam, acompanham, ajudam e monitorizam (no sentido de também fiscalizar) os profissionais do campo. Têm formação específica para esse cargo e pode considerar-se como estando situados num patamar acima na linha hierárquica da instituição depois desses entrevistadores. Não existe qualquer tipo de atropelos nas funções, nem qualquer dúvida sobre as suas competências, uma vez que as linhas de actuação estão claramente definidas. De certo modo este supervisor é visto como um chefe, numa perspectiva Taylorista, pelos entrevistadores pois os primeiros têm o poder de dispensar os segundos se o trabalho não for apresentado dentro dos critérios exigidos.
Parece ser de consenso geral que o professor supervisor deverá ser mais experiente e mais bem formado nas áreas, já referidas, que envolvem a supervisão: científica, pedagógica, administrativa/organizativa e humana/social/participativa. Poderá existir aqui uma contradição uma vez que, na realidade, são os menos experientes que possuem melhor formação ao nível pedagógico, melhor formação ao nível administrativo (salvo alguma área cientifica mais específica), igual formação ao nível científico e dificilmente se escrutina quem será o melhor ser humano no que respeita à sociabilidade e à humanidade. E como alerta Arendt (1978, cit. Rangel, 2001), a falta de formação para se exercer um cargo pode provocar um autoritarismo que nada tem a ver com a autoridade (necessária) baseada na competência e na confiança. Já Esteve (1984) dizia que
“Muitos dos esquemas autoritários que existem na escola não são mais do que uma forma de autodefesa para encobrir a insegurança gerada pela consciência de uma deficiente preparação” (cit. Teixeira, 1995, p. 155)[4].

Também Leal e Henning (2009) enfatizam constantemente a necessidade do “poder disciplinar” para se poder levar avante todo o processo. E este poder não se consegue, certamente, sem a respectiva formação do supervisor e consequentemente sem a aceitação dos supervisionados.
Nesta perspectiva e considerando a unidade Escola, na sua organização, como enquadrada num modelo organizativo do tipo “burocracia profissional” tal como Mintzberg (1999) a define (ou seja, o próprio profissional controla o seu trabalho), ficam sempre as dúvidas sobre a utilidade do trabalho supervisivo tendo em conta que os novos professores tiveram uma acreditação nas escolas superiores através de uma formação específica para desempenhar a sua profissão de docente ao contrário dos mais velhos (experientes) que tiveram somente a formação cientifica e um estágio pedagógico integrado mas de uma ligeireza que os seus próprios frequentadores duvidam a sua eficácia[5].
Mas, dum modo geral insiste-se no ponto que o supervisor deve ser mais experiente que o supervisionado e deve ter as funções principais de regulador e de prestar ajuda ao supervisionado. Falta, provavelmente, definir as regras de nomeação do supervisor tendo em conta a posse dos atributos anteriormente discutidos a fim de ser aceite pelo supervisionado sem qualquer tipo de desconfianças, pois, parece inegável, que este tipo de relação, este tipo de ação, só pode trazer vantagens para todos. Idealmente sugere-se que o supervisor tenha características de um líder com uma visão estratégica. Alarcão (in Rangel, 2001, p. 50) vai mais longe e afirma mesmo que o supervisor é um “líder de comunidades formativas” ou de “comunidades aprendentes” (idem, 2009, p.126). Possuir pensamento estratégico, poderá entender-se como ter uma perspectiva de futuro baseada nos acontecimentos do passado fazendo-se um acompanhamento assíduo do plano elaborado.
Alarcão e Tavares (1987) confessam uma predilecção pelo estilo de supervisão duma forma colaborativa. Nessa obra apresentam mais dois estilos: não-directivo e directivo. Estes estilos são rotulados ao supervisor que opta, duma forma consciente ou não, pela incidência que faz a uma série de comportamentos, dez no total, propostos por Glickman (1985, cit. idem) tais como: “prestar atenção”, “clarificar”, “encorajar”, “servir de espelho”, “dar opinião”, “ajudar a encontrar soluções para os problemas”, “negociar”, “orientar”, “estabelecer critérios” e “condicionar”.
Para uma melhor compreensão de relacionar os estilos do supervisor aos estilos de lideranças, pretendo a seguir, tentar fazer essa comparação tendo em consideração o carácter imprevisível da organização escolar e da colegialidade dos seus órgãos. Neste sentido, será mais indicado falar-se em “(...) lideranças do que liderança, mais nos lideres do que no líder” (Costa, in Costa, Mendes e Ventura, 2000, p. 26). Rego (1998) define alguns estilos de liderança, identificando muitas das suas características humanas, técnicas, interpessoais e conceptuais. Retirei dessa análise dois estilos que convém referir, dado serem os mais abrangentes e os mais elucidativos e acrescentei mais um terceiro, cuja existência me parece de aceitação consensual, retirado da diversa literatura:
1. Autoritário - aquele que no grupo/equipa exerce o papel de líder assumido, onde os seus seguidores[6] lhe obedecem, tendo um papel de “comandante” que inclui responsabilidades e funções que não podem ser partilhadas por outros sob pena de prejudicar a eficácia do grupo – liderança tradicional semelhante a uma chefia;
2. Participativo - aquele que tem uma liderança partilhada (ou participativa, como refere o autor) não havendo uma distinção clara entre líder e seguidores – liderança centrada no grupo;
3. Laisser-faire – aquele que não se intromete, orienta e só interfere se solicitado.
Assim, o quadro pretende resumir as ligações correspondentes:



De referir ainda os resultados dos estudos sobre as preferências por parte dos professores supervisionados por cada estilo apresentado (Alarcão e Tavares, 1987). Se se tratar de candidatos a professores, a preferência recai maioritariamente sobre o estilo directivo, se for o professor já na carreira a preferência incide sobre o estilo colaborativo. As razões parecem-me óbvias e prender-se-ão com a insegurança dos primeiros e a confiança, que convém assumir, dos segundos.

7- Problemas no relacionamento entre o supervisor e supervisionado
Entramos num campo de análise consequente que nem sempre se verifica nas melhores condições na Escola: relações humanas com os respectivos conflitos daí recorrentes. Aliás, a professora do ensino secundário Fernanda Lamy (2009) na sua reflexão sobre o tema também alerta para estes conflitos evidenciando as suas dúvidas sobre a correta definição dos critérios na escolha do supervisor. Parece-me então que esta ação reflexiva conjunta, esta ação colaborativa onde a linha hierárquica se achata (bem na definição da organização do tipo burocracia profissional referida por Mintzberg, 1999), que se pretende entre o supervisor e o professor não terá qualquer efeito se as relações pessoais não forem de total cumplicidade. Curiosa é a referência que Alarcão e Tavares (cit. Alarcão, 2009), e Soares (2009) na mesmíssima linha de pensamento (parecendo até que cita os anteriores), fazem, sem se alongarem, ao “desenvolvimento humano” do professor por parte do supervisor ficando a ideia que o supervisor deverá ser o mais sociável e o mais humano. Reconhece-se, no entanto e como já foi referido, que o termo supervisão não se livra de uma conotação autoritária podendo ser percepcionada duma forma intimidatória e rejeitada pelo supervisionado se se reconhecer que o supervisor não possui essas características sociais e humanas essenciais para essa relação, sem descuidar, obviamente, as outras (científicas, pedagógicas e administrativas). Parece-me então que deveriam ser claramente exigidas habilitações específicas para exercer o cargo, uma comprovada experiência profissional e uma leitura correta do Director da Escola numa tentativa de procurar verificar a existência de qualquer tensão existente entre os protagonistas.
Dum modo geral tenho verificado na Escola que não são aproveitadas convenientemente as novas habilitações dos professores que estes adquiririam para além da sua formação inicial. Outro dos aspectos que podem promover a fragmentação das relações humanas/sociais é a falta de transparência das medidas bem como a clarificação das competências de cada um na sua função.

8- Implementação
Santos e Brandão (2006, inspiradas em Pascal e Bertram, 2000) sugerem uma “escala de empenhamento do adulto como apoio à função supervisiva” através dos seguintes indicadores: sensibilidade, estimulação e autonomia. Referem-se somente à observação de aulas (diria, numa perspectiva clínica) e à relação que o supervisionado tem com os seus alunos. Ora, a supervisão pedagógica pretende ser muito mais abrangente tornando essa escala muito redutora. No entanto, e pretendendo ser objectivo, poder-se-ia elaborar um instrumento de observação que avaliasse formativamente o supervisionado nas dimensões que tenho vindo a destacar: científica, pedagógica, administrativa/organizativa e humana/social/participativa.
Ao ler Rangel (2001) apercebem-se bem as diferenças culturais, organizativas, sociais, etc. entre Portugal e Brasil. Assim, a supervisão pedagógica no Brasil na sua aplicabilidade terá forçosamente que ser diferente bem como nos diversos níveis de ensino, daí a análise que se segue focar somente a escola do 3ºciclo e do secundário, pois é essa realidade que conheço. Quero dizer com este meu raciocínio, claramente, que, embora os conceitos gerais e a sua interiorização possam ser os mesmos, não me parece que a supervisão pedagógica na educação pré-escolar (5 anos) se possa implementar da mesma forma que na educação a alunos do 12º ano (18 anos).

Conclusão
Ao lerem-se os artigos publicados nesta área e as obras de referência fica-se com a ideia que se batalha em torno das mesmas ideias com pequenas nuances entre elas. Ou seja, parece-me que ao invés de procurarmos clarificar o conceito, dizer objectivamente o que se pretende com ele definindo o modo da sua implementação, definir os critérios de quem pode vestir a farda de supervisor, enfim, promovê-lo, continuamos a rodeá-lo com flores[7] acrescentando variantes algo confusas como “supervisão reflexiva” (qualquer procedimento consciente, pedagógico ou não, leva-nos, certamente, a reflexões), “supervisão democrática” (não se compreende que possa ser de outra forma sob pena de falhar redondamente uma vez que estamos a discutir a Escola pública), “auto-supervisão” (só tem lógica se for promovida pela supervisão, tal como Leal e Henning, 2009, referem), “hetero-supervisão” (deixa de ter as características intrínsecas da supervisão e sugere uma exagerada cumplicidade entre confrades), etc. O termo carece de delimitação se olharmos para ele num contexto educacional mais concretamente na relação entre professores. Parece-me, por exemplo, que não devemos confundir supervisão pedagógica que se faz de uma forma continuada ao profissional docente com supervisão pedagógica realizada na formação inicial do candidato a professor como a diversa literatura tende a misturar (já referido anteriormente). Expressões como “ensinar o professor a ensinar” (Alarcão e Tavares, 1987, p. 34) não tem muito sentido se aplicado ao professor sénior consciente da sua formação contínua, mas poderá tê-lo se considerarmos o candidato a professor. Deveríamos, se quisermos ser mais precisos, separar até os níveis de ensino pois as realidades numa escola/sala de aulas são muito diferentes se se tratar do 1º ciclo ou do 12ºano. Mas, atendendo ao que nos dizem Alarcão e Tavares (1987), podemos estudar a supervisão duma forma alargada, pois, numa análise geral, “os elementos comuns ao exercício da supervisão nos diferentes níveis são em maior número do que os elementos que lhe são específicos” (idem, p. 18). No entanto, deveremos reconhecer que, por exemplo, dois professores (ou dois agentes com características semelhantes na perspectiva dos alunos) numa sala de aulas podem trazer alguns problemas de eficácia e alguns constrangimentos à dinâmica e às “imprevisibilidades previstas” numa aula delegando o resultado da sessão supervisiva para mais uma experiência sem qualquer resultado prático no que respeita à aprendizagem dos alunos, pelo menos no decurso dessas observações.
Continuamos também a encher-nos de teorias sobre o que temos de fazer mas poucas se debruçam sobre a forma como o deveremos fazer. Esta opinião é generalizada ao dizer-se que os estudiosos das Ciências da Educação pouco produzem no sentido de melhorar a situação[8]. Arriscarei a seguir propor algumas soluções para que os professores na sua prática docente fiquem a saber com o que podem esperar se forem supervisionados.
Carmo e Ferreira (1998) chamam a atenção sobre os constrangimentos que poderão existir quando o investigador está muito próximo do objecto de estudo. Mas também referem as vantagens. Parece-me que revisões da literatura e fundamentações teóricas não são difíceis de serem feitas por um estudante ao nível de um mestrado/doutoramento. O que me parece que está a faltar é a perspectiva dos professores, enquanto agentes do processo, que prolongam os seus estudos nesta área, ou seja, a ligação da fundamentação teórica com a prática de trabalho enquanto profissionais. Neste sentido, passarei a expor aqui o meu contributo. Assim algumas das minhas perguntas e as respectivas respostas, dirigindo a supervisão pedagógica para as escolas publicas portuguesas do 3º ciclo e secundário aplicada a professores em carreira, e tendo em atenção a minha envolvência nas escolas, são as seguintes:
- O supervisor (a figura) pode ser alguém que não tenha tido a experiência de professor?
Não.
- Quantos anos no mínimo devem ter de experiência o supervisor?
Dez (mais ano menos ano).
- O supervisor pode exercer o cargo sem ter tido formação especializada?
Deve ter formação em supervisão pedagógica ao nível de mestrado e/ou áreas afins.
- Que estilo de supervisão o supervisor pedagógico deve adoptar?
Deve ser, com predominância quase total, o estilo “colaborativo” já referido e caracterizado por Alarcão (1987).
- Que áreas devem ser supervisionadas?
Devem ser as cientificas, as pedagógicas, as administrativas/organizacionais e as sócio-afectivas/participativas.
- Deve a supervisão ter como resultado, também, uma avaliação docente?
Sim, pois os supervisores pedagógicos seriam os profissionais mais bem formados para a fazer. E não me parece que se consiga desassociar supervisão pedagógica de avaliação docente.

- O que se pretende com a supervisão pedagógica?
A ideia da supervisão pedagógica tende a imaginar um professor controlador e avaliador das nossas acções. Deve então começar por aqui o início da desmistificação contrariando o que pensam Leal e Henning (2009). Talvez começar por mudar o nome ao conceito e ao cargo acabando também com a ligação que ainda tem à sua génese da produção industrial e repressiva em geral. Chamar-lhe, talvez, “orientação da prática pedagógica” conforme o entendimento de supervisão pedagógica que têm Alarcão e Tavares (1987, p. 47) ou “desenvolvimento docente” e aos professores supervisores chamar-lhes “professores de cooperação”. No Brasil, segundo Ferreira (in Rangel, 2001), não correu muito bem a tentativa de aligeirar os termos, mas, realce-se que os motivos dessa alteração foram outros. Na realidade o que se pretende com a actividade supervisiva passa por uma orientação solidária num trabalho colaborativo, por uma procura de encontrar soluções, enfim, por melhorar a prática pedagógica. Pretende-se que seja visto numa “abordagem dialógica” conforme Alarcão (in Rangel, 2003) a define e como a mesma autora expressa claramente que não deve ser vista “no contexto sala de aulas, mas no contexto mais abrangente da escola” (idem, p. 31). A respeito da supervisão pedagógica (ou científica) na sala de aulas, e como agente observador participante, não vejo qualquer mais valia a observação de aulas nos níveis 3º ciclo e secundário. A um nível mais baixo poder-se-á encontrar vantagens mas a um outro nível facilmente se prepara uma encenação relegando a supervisão in loco nesse espaço de trabalho para mais uma inutilidade sem qualquer efeito positivo[9]. É necessário, no entanto, uma figura, que poderia ser chamado qualquer coisa menos supervisor, que fosse orientador e conhecedor dessas premissas de forma a não levantar qualquer suspeita ao supervisionado em relação às suas competências.
- Como deve ser implementada?
Esta cooperação deve ser realizada a partir dos Grupos disciplinares (mais específicos) e não a partir de Departamentos Curriculares (mais gerais) e devem abranger áreas como a científica, a pedagógica, a administrativa/organizacional e a humana/social/participativa. Dever-se-ia elaborar uma tabela para cada uma das áreas a serem observadas, do género, mas melhorada/adaptada, “escala de empenhamento do adulto como apoio à função supervisiva” (Santos e Brandão, 2006). Cada área/dimensão, os mesmos para todo o sistema educativo português, subdividir-se-ia em outros itens. E estes deveriam ser discutidos/negociados entre o supervisor e supervisionado. Deveriam, numa fase inicial, ser propostos duma forma geral pelo regulador Estatal e depois adaptados/escolhidos/corrigidos/negociados à realidade da Escola e toda a sua envolvência, ou seja, à realidade da sociedade/comunidade, à realidade da especificidade da disciplina e à realidade da faixa etária dos alunos onde se realizaria o processo supervisivo.
- Quem deve assumir o cargo de supervisor?
De forma a que não se levantasse qualquer problema na aceitação do supervisor, este deveria ter pelo menos 10 anos de experiência como professor, possuir um curso pós-graduado na área das ciências da educação (idealmente na especialidade supervisão pedagógica) e, depois de verificadas estas duas premissas, o director da Escola deveria ter a sensibilidade que se espera de um líder escolar para nomear um ser humano com características humanas, socais e democráticas. Não me parece que um professor sénior, consciente da sua formação e da sua experiência, aceite pacificamente (pode ler-se: perspectivando alguma utilidade no processo, pois é disto que se trata) ser supervisionado, nos moldes que se define na diversa literatura, por um colega de profissão com menos formação académica nas diversas áreas e, até, podendo facilmente acontecer, menos experiência.
- Que resultados esperar?
Qualquer actividade que se realize na escola deve levar a uma melhor qualidade na educação. Sendo que esta qualidade não tem efeitos imediatos (dificilmente se consegue provar) e sendo também da concordância da opinião pública em geral que os professores devem ser avaliados no seu desempenho, sou de opinião que a supervisão pedagógica deveria resultar numa avaliação (aliás, Rangel, 2001, também a enfatiza) com a respectiva classificação tendo em vista a sua progressão na carreira. Os aspectos a avaliar incidiriam nas actividades administrativas realizadas pelo próprio (resultando numa classificação depois de verificada a grelha de observação da área administrativa falada atrás, pois fazem parte da actividade do profissional docente numa organização do tipo burocracia profissional – Mintzberg, 1999), na actualização dos seus conhecimentos (este item faria parte integrante da grelha de observação nas áreas científicas e pedagógicas, referidas atrás) e nas actividades do Plano Anual de Actividades dinamizadas pelo supervisionado (e este item faria parte integrante da áreas supervisionada das relações humanas/social/participativa). Para já estou a falar de factos facilmente percepcionáveis em termos de registo em grelhas de observação. Para os outros, mais subjectivos, sou de opinião que com alguma facilidade se chegaria a um acordo entre o supervisor, supervisado e direcção da Escola.
Finalizo dizendo que na minha prática profissional como docente do 3º ciclo, secundário e do ensino profissional numa escola profissional, nunca me senti ou julguei supervisor, apesar de passar pelos diversos cargos que julgamos que deveriam ter essas funções, nem nunca me senti supervisionado do modo como se refere a literatura estudada. Mas, curiosamente, os autores estudados referem-se a estes conceitos como se fosse uma prática rotineira utilizada nas escolas. Precisa-se por isso de devolver a teoria à prática, diria, precisa-se mesmo que aconteça a segunda ruptura epistemológica[10]. Em Costa, Ávila e Mateus[11] esta segunda ruptura é chamada de “duplo paradoxo”, justificado com a existência de um “paradoxo cognitivo” (dar a conhecer a ciência a quem não a pratica) e com um “paradoxo democrático” (mais informação das decisões através da participação das populações contrastando com a falta de conhecimentos destas).

Bibliografia
· ALARCÃO, Isabel – Formação e supervisão de professores: uma nova abrangência. Lisboa: FPCEUL Sísifo Revista de Ciência da Educação nº 8, 2009
· ALARCÃO, Isabel; TAVARES, José – Supervisão da Prática Pedagógica – Uma perspectiva de desenvolvimento e aprendizagem. Coimbra: Livraria Almedina, 1987
· CARMO, Hermano; FERREIRA, Manuela M. - Metodologia da Investigação - Guia para Auto-aprendizagem. Lisboa: Universidade Aberta, 1998
· COSTA, Jorge A.; MENDES António N.; VENTURA, Alexandre (orgs.) – Liderança e Estratégia nas Organizações Escolares. Aveiro: Universidade Aveiro, 2000
· LAMY, Fernanda – Supervisão Pedagógica. Vila Nova de Gaia: Edições Asa, Revista Correio da Educação nº 339, 2009
· LEAL, Adriana; HENNING, Paula – Do Exame da Supervisão ao Autoexame dos Professores: estratégias de regulação do trabalho docente na Supervisão Escolar. Brasil: Revista Currículo sem Fronteiras, v.9, n.1, pp.251-266, 2009
· MINTZBERG, Henry – Estrutura e Dinâmica das Organizações. Alfragide: Publicações D. Quixote, 1999
· PRATES, Maria L.; ARANHA, Ágata; LOUREIRO, Aramando – Liderança: supervisão e aprendizagem partilhada na escola actual. Bragança: Instituto Politécnica de Bragança, Revista Eduser: revista de educação, Vol 2(1), 2010
· RANGEL, Mary (org.) – Supervisão Pedagógica – princípios e práticas. Campinas SP: Papirus Editora, 2001
· REGO, Arménio – Liderança nas Organizações – Teoria e Prática. Aveiro: Universidade de Aveiro, 1998
· SANTOS, Cristina [et al.] – Escola como Sistema, Mundo de Vida e (re)organização: reptos à Supervisão Pedagógica. Porto: ESSE de Paula Frassinet, Repositório Caderno de Estudos nº 9, 2008
· SANTOS, M. Alice; BRNDÃO, M. Isabel – A supervisão pedagógica numa articulação entre a preparação do educador, a formação do aluno e a qualidade da educação das crianças – a função da escala de empenho do adulto na concretização deste processo. Porto: ESE de Paula Frassinet, Repositório Caderno de Estudos nº 7, 2006
· SOARES, Margarida – Supervisão Pedagógica - Para uma prática de ensino mais eficaz, mais comprometida, mais pessoal e mais autêntica. Matosinhos: CFAE Ozarfaxinars E-revista nº 12, 2009
· VIEIRA, Flávia – Para uma visão transformadora da supervisão pedagógica. Campinas (Brasil): Revista Educação & Sociedade, vol. 29, n 105, pp. 197-217, 2009

[1] Docente do Seminário Teorias e Modelos de Supervisão Pedagógica no 3º ciclo de estudos em Educação na especialidade Liderança Educacional na Universidade Aberta.
[2] VIEIRA, Ricardo – Histórias de Vida e Identidades. Professores e Interculturalidades. Porto: Ed. Afrontamento, 1999
[3] De Mintzberg (1999) retira-se que são os professores a fazer parte deste centro operacional.
[4] TEIXEIRA, Manuela – O Professor e a Escola – Perspectivas Organizacionais. Amadora: McGraw-Hill, 1995.
[5] Sem querer ferir susceptibilidades, eu sou um deles e ainda não conheci nenhum colega que não pense do mesmo modo.
[6] “Sem seguidores não há lideres” (Rego, 1998, p. 423)
[7] Esta metáfora foi-me sugerida por Bourdieu (1989) ao comparar os “termos empolados da grande teoria” (idem, p. 28) como um tipo de prazer em “colar rótulos novos em frascos velhos” (ibidem) - BOURDIEU, Pierre – O Poder Simbólico. Lisboa: Difel, 1989.
[8] Quem o diz, por exemplo é professor António Teodoro (TEODORO, António – Professores para quê? Mudanças e desafios na profissão docente. Porto: Profedições, 2006).
[9] Curiosas são as frequentes preparações prévias das aulas quando são observadas. Nesses dias o professor que vai ser observado entra mais cedo para a sala de aulas e prepara os recursos antecipadamente, desde videoprojector a outros materiais. Ora, não é isso que fazemos em dias normais. Estamos assim a teatralizar desvirtuando a avaliação. No entanto consigo facilmente prever sessões assistidas na educação pré-escolar mas, também aqui, não consigo vislumbrar muitas vantagens nessa forma de observação.
[10] Boaventura de Sousa Santos chama a este corte com o senso comum de “primeira ruptura epistemológica”. A passagem, do conhecimento adquirido com a investigação, para a restante comunidade com o objectivo de contribuir para a sua formação, apelida-a de “segunda ruptura epistemológica”.
[11] COSTA, António F.; ÁVILA, Patrícia; MATEUS, Sandra – Públicos da Ciência em Portugal. Lisboa: Gradiva, 2002



Luis F. F. Ricardo (2010)