(AC) Ser Professor

Uma reflexão sobre as práticas, tarefas, actividades, papéis, atribuições, … dos professores


“O professor é sobretudo um profissional da relação (...) é uma profissão com enormes possibilidades de realização pessoal e, simultaneamente, é uma profissão em que a frustração quando acontece, pode ter um dos efeitos mais destruidores, uma vez que, quando não me realizo profissionalmente, não me construo como pessoa” (Teixeira, 1995, p. 161).
Sacristán (in Nóvoa, 1991), citando Tom (1984, 1987), sugere quatro formas de encarar o ensino como actividade profissional: (1ª) como ofício através dos saberes adquiridos pela experiência, (2ª) como aplicação de uma ciência, (3ª) como uma arte, e (4ª) como empenhamento moral destacando a odontologia e a ética. Assim, “uma correcta compreensão do profissionalismo docente implica relacioná-lo com todos os contextos que definem a prática educativa” (idem in idem, p. 74). E prossegue: “é preciso enfrentar as questões do poder na educação não aceitando uma limitação do papel dos professores aos aspectos didácticos” (idem in idem, p. 75).
A escola é assim um sistema complexo que apela à constante criatividade do professor, pois existem “(...) factores aleatórios e imprevisíveis no acto educativo” (Nóvoa, 1992, p. 14). Assume-se, deste modo e reiterado por “todos”, uma aproximação entre a actividade docente e a arte. Harris (1976, cit. Woods, in Nóvoa, 1991) dizia mesmo sem receios que o ensino é uma arte. Considerava os professores actores, como aliás são constantemente designados noutra perspectiva, tendo literalmente de representar em vários contextos dentro da escola. Dizia ainda que o professor tem de actuar como comediante ressalvando no entanto que esta questão precisa de ser estudada. Justificando-se, dizia que têm de abrilhantar ou enfeitar os textos, os discursos e as equações, de forma a ficarem mais apetecíveis aos alunos. Facilmente se constata que um sentido de humor oportuno e uma boa disposição pode ser contaminante e ser essencial para a criação de um clima saudável. Aliás Goodson (in Nóvoa, 1992), referindo-se a um colega, deixa escapar as seguintes características de um excelente professor: "(...) muito popular entre os alunos, aberto, com sentido de humor, cativante e motivador” (in idem, p. 65). João Amado, numa acção de formação em 2006 na Escola Secundária Engenheiro Acácio Calazans Duarte, dizia, num contexto de prevenção da indisciplina, que o “professor tem de saber rir”. Mas atenção: as atitudes confrontadoras das rotinas burocratizadas, robotizadas e instaladas, podem alimentar os “vigilantes da legalidade”, os mais “seguidistas”, e iniciar-se mais algum mal-estar provocado por eventuais incompreensões resultando em acusações suportadas por esse alinhamento à retórica.
Na obra de Teixeira (1995), com base em Formosinho (1987), retiram-se as seguintes funções gerais que de uma forma consensual aparecem, implicitamente, na maioria dos textos relacionados: (a) “instruir” no seguimento dos conteúdos programáticos bem com a avaliação da sua aquisição, (b) “educar” valores e atitudes introduzindo o gosto em participar em actividades extra-lectivas de índole educativa, (c) “desenvolver acções educativas no meio” e, (d) “outras funções de natureza instrumental” tal como cuidar da escola, informar e realizar estudos e trabalhos de investigação. No entanto, convém referir que as funções dos professores não deverão ser estáticas, mas antes facilmente moldáveis consoante “as necessidades sociais a que o sistema educativo deve dar resposta (...)” (Sacristán, in Nóvoa, 1991, p. 67) e, prosseguindo, este autor afirma que “a evolução da sociedade tende a afectar à escola um conjunto mais alargado de funções” (idem, in ibidem), dando origem a constantes viragens e indefinições dessas funções. Teodoro (2006) também destaca este raciocínio acrescentando que este aumento de funções se deve a uma resposta aos novos problemas emergentes na sociedade. Mas este mal-estar docente já vem referido em “todos” os manuais sobre a prática docente e não é um problema exclusivo português pois é destacado como um problema geral em todo o mundo. Teodoro (idem, p. 93), parecendo desabafar, diz mesmo que “…os professores nunca trabalharam tanto para ver tão pouco resultados…”. E Maria Filomena Mónica (Jornal “Público”, 1-11-2007) sob o título “Deixem os professores em paz” acrescenta que “um professor precisa de uma sólida preparação de base, prestígio junto da comunidade e autonomia de acção”. Parece-me então que, de facto, este mal-estar existe e não nos livraremos dele tão cedo.
Assim, e resumindo, o professor é um transmissor de conhecimentos, é um criador de conhecimentos (devia ser), é um acreditador de conhecimentos (certifica), é um criativo e artista (engendra e improvisa), é um crente (acredita que todos podem aprender), é um apaixonado pelos alunos (sem excepção), é um justiceiro, é um avaliador/classificador, é um socializador e educador (aqui, idealmente, em estreita colaboração com os encarregados de educação) e, ainda, é um funcionário (embora esta vertente devesse ser reduzida a perto de zero). Estou seguro ao afirmar que ninguém faz tanta falta a um país como o professor. Por isso, apoiem-no e dotem-no.
Referências bibliográficas
· NÓVOA, António (org.) – Profissão Professores. Porto: Porto Editora, 1991
· NÓVOA, António (org.) – Vida de Professores. Porto: Porto Editora, 1992
· TEIXEIRA, Manuela – O Professor e a Escola – Perspectivas Organizacionais. Amadora: McGraw-Hill, 1995
· TEODORO, António – Professores, para quê? Mudanças e Desafios na Profissão Docente. Porto: Profedições, 2006

Luís Filipe Firmino Ricardo (2008)