(AC) O que nos move? (1)

Uma reflexão sobre as teorias motivacionais


“A motivação não é nem uma qualidade individual, nem uma característica do trabalho: não existem indivíduos que estejam sempre motivados nem cargos motivadores para todos (...)” (Lévy-Leboyer, 1999, cit. Jesus, 1996, p. 26).
Verifica-se que os funcionários numa organização têm diferentes resultados apesar de possuírem as mesmas qualificações e as mesmas condições, ou seja, o comportamento humano é movido por determinadas necessidades. Daí a justificação do aparecimento do termo motivação no estudo das organizações. Locke (1976, cit. Seco, 2002) dividiu as teorias da motivação no trabalho em duas grandes categorias. Nas (1as) “Teorias dos Conteúdos” a preocupação é encontrar o objecto da motivação. Procuram especificar os valores e as causas para que o indivíduo se sinta motivado. As (2 as) “Teorias Processuais” estão centradas em saber como se exprime a motivação, assumindo-se que a causa motivadora não é a mesma para todos. Retira-se deste segundo grupo de teorias, que a motivação é directamente proporcional à satisfação no trabalho e “É geralmente aceite que as teorias processuais oferecem uma melhor explicação teórica da motivação para o trabalho, e, consequentemente, da satisfação, do que as teorias de conteúdos” (Seco, idem, p. 28).
Existem, assim, várias teorias sobre a motivação. Só a obra de Soto (2001) aborda quinze grupos de teorias, das quais vou tentar resumir as mais conhecidas e tentar estabelecer uma relação com a organização escolar.
A primeira teoria, dentro das “Teorias dos Conteúdos”, apareceu com Abraham Maslow em 1943, que definiu uma hierarquia de necessidades, adiantando que as pessoas só têm necessidades superiores depois de verem satisfeitas as inferiores.
Locke (1976, cit. Seco, 2002) aponta-lhe algumas limitações dizendo que não se provou se os factores definidos são de facto necessidades. Na mesma obra, Graça Seco, junta também Robbins (1996) nessas dúvidas acrescentando que a pirâmide poderá estar invertida nos contextos em que se poderá valorizar mais as necessidades de segurança. Estabelecendo uma extrapolação para a profissão docente, poderá deduzir-se que a primeira necessidade (fisiológica) está satisfeita, pois não me parece, salvo qualquer patologia em contrário, que os professores passem fome, sede, ou que tenham um horário tão mau que não lhes permita dormir o tempo suficiente. O mesmo se poderia dizer em relação à segunda necessidade (segurança) se não fosse o caso dos professores contratados, pois, segundo Maslow (citado por Sousa, 1990), satisfaz-se recebendo o ordenado e pagando os seus impostos. Retirando as influências exteriores (familiares e/ou outras) que são praticamente inacessíveis à organização, a terceira necessidade (afecto) pode ser tratada na organização com a criação e incentivo ao envolvimento nas actividades de um grupo e consequentemente de relações de amizade. Assim, “a principal conclusão que se pode tirar (...) é a de que, num contexto de bem-estar económico e de pleno emprego, as necessidades mais baixas da hierarquia estão normalmente satisfeitas” (Seco, 2002, p. 18) podendo incluir-se neste desenho a profissão docente pelo menos no que respeita aos professores do quadro. Constata-se que o prestígio (quarta necessidade) dos professores tem vindo a decrescer face aos inúmeros desempregados na área e face às inúmeras profissões emergentes de qualificação superior, bem como “(...) à alteração do papel tradicional dos professores no meio local” (Jesus, 1996, p. 28). Como se pode inverter a situação? O “respeito por si próprio é a chave para a necessidade prestígio” (Sousa, 1990, p. 141), ou seja, para ser respeitado pelos outros, a fim de ser respeitado por si próprio, terá de esforçar-se para conseguir atingir os objectivos determinados pela organização. A última necessidade (quinta: auto-realização) tem a ver com o que cada um de nós quer e consegue ser, sendo então outra necessidade de carácter estritamente pessoal, inacessível à organização. As áreas que os gestores/administradores escolares poderão trabalhar, com base na teoria de Maslow, são, sem dúvida, a terceira necessidade (afecto) e quarta necessidade (prestígio).
Na década de 50 surgiu Frederick Herzberg com a conhecida “Teoria dos Dois Factores” que se resume à relação directa da satisfação com a motivação. Pode verificar-se que o sistema educativo tem uma particular importância no que respeita à insatisfação no trabalho pois, os três primeiros factores (política da empresa e administração, supervisão e, relação com o supervisor), são da sua responsabilidade directa. De notar que nesta teoria o salário, como outros factores, não podem ser vistos como factores de motivação, mas sim como ajuda na diminuição da insatisfação. Também aqui aparecem Locke e Robbins (Seco, 2002) a apontar algumas limitações à generalização dos resultados desse estudo. Apesar de fazerem investigações complementares, resultando em conclusões muito semelhantes, apontam que o estudo se baseou em 200 engenheiros e contabilistas de uma determinada zona industrial de um determinado país rico.
Aparece depois, nos anos 60, McClelland com a “Teoria dos Tipos de Personalidades” onde diz que os indivíduos se motivam segundo a personalidade adquirida socialmente, dando uma particular atenção ao recrutamento de quadros. Para a compreender, a motivação para o desempenho é vista segundo três impulsos, ou três necessidades: (1) realização (querer ser bem sucedido), (2) poder (influenciar e controlar os outros) e (3) afiliação (desejo de ter amizades e ser aceite pelos outros). Parece-me que os traços de personalidade podem assim ser construídos de acordo com o ambiente social que nos rodeia e poderão ser melhorados com a entrega de cargos e com depósitos de confiança.
Vroom em 1964 “procurou estudar as relações entre traços de personalidade e participação” (Lima, 1998, p. 123). Esta “Teoria das Expectativas” (posteriormente Lawler em 1986 também contribuiu para esta teoria) ao dizer que a força motivacional se deve às expectativas que temos do sucesso previsto, acrescenta mais uma responsabilidade à necessidade de existirem objectivos claros na organização e uma previsão dos resultados. Pode-se dizer que a base desta teoria assenta em três relações, que são, (1) esforço vs desempenho, (2) desempenho vs recompensa e (3) recompensa vs objectivos pessoais. Para a suportar surgem cinco conceitos principais: (1) resultados (metas esperadas da organização), (2) valência (interesse que se tem pelo trabalho, ou expectativa sobre o resultado), (3) instrumentalidade (relação entre o desempenho e meta alcançada), (4) expectativa (antevisão do resultado em função do seu desempenho) e (5) força (característica pessoal capaz de provocar a motivação). Neste seguimento, Seco (2002) faz uma previsão de que seria um fracasso aplicar a teoria de Vroom ao contexto docente, baseando-se no desajustamento entre os pressupostos da teoria e o modelo de avaliação de desempenho do pessoal docente. Acrescentaria que, apesar das melhorias existentes na avaliação de desempenho docente vindas com o novo Estatuto (2007), continuaria a ser um fracasso dado que seria muito difícil detectar quem teria participado mais num determinado sucesso e provavelmente traria uma competição desenfreada entre colegas. No entanto, um ideário de escola claro, curto e prático onde se expressem os objectivos específicos, parece-me fundamental em qualquer organização.
Ainda uma referência à chamada “Teoria da Equidade” proposta por Adams em 1965. Assenta os seus pilares na desigualdade que as pessoas constatam quando comparam o seu ganho com o dos outros, onde se inclui o resultado dos trabalho feitos em diferentes condições, níveis de escolaridade, promoções, privilégios, etc. Esta teoria faz sobressair a impotência do administrador escolar a este nível, pois na escola verifica-se entre os professores, por diversas razões, diferenciação entre as cargas horárias, remunerações e mesmo condições de trabalho constatando-se também diferentes resultados, não existindo qualquer relação lógica entre regalias e resultados. Como se sabe os que têm um menor horário, em virtude dos anos de serviço, são os que ganham mais, podendo parecer um paradoxo pois “quanto mais experiente é um professor menos é utilizado” (idem, p. 77). Vários estudos, destacados em Jesus (1996), apontam que este aumento salarial com base na antiguidade não é um bom incentivo para a motivação dos professores. Estes preferiam um pagamento por mérito baseado no esforço na sala de aulas. Mas, à semelhança da teoria anterior, o cálculo também não seria pacífico e a meritocracia poderia não trazer os resultados esperados ao provocar uma competitividade desmedida e um maior individualismo.

Bibliografia referenciada
· JESUS, Saúl N. – Motivação e Formação de Professores. Coimbra: Quarteto Editora, 1996
· LIMA, Licínio – A Escola como Organização e a Participação na Organização Escolar. Braga, Universidade do Minho, 1998
· NÓVOA, António (org.) – Profissão Professores. Porto: Porto Editora, 1991
· SECO, Graça M. S. Batista – A Satisfação dos Professores – Teorias, Modelos e Evidências. Porto: Edições Asa, 2002
· SOTO, Eduardo – Comportamento Organizacional – o Impacto das Emoções. São Paulo: Internacional Thomson Editores, 2001
· SOUSA, António de – Introdução à Gestão – Uma Abordagem Sistémica. Lisboa – São Paulo: Editorial Verbo, 1990

Luís Filipe Firmino Ricardo (2008)