(AO) Avaliação de desempenho docente

Uma critica à inépcia do processo para se conseguir obter uma justa avaliação


Parece-me que existem profissionais cujo desempenho não se adequa a uma avaliação mensurável. Todas as profissões em que não é possível separar o “eu pessoal” do “eu profissional”, tais como professores (ou ministros, sem qualquer ironia), nunca se conseguirá obter uma avaliação justa, pois “jamais” (com sotaque francês e, aqui, com ironia) se conseguirá verificar se estão a fazer o melhor que podem, e devem, nas áreas de ensino, formação e educação (acrescentando-se também o investimento material dos próprios), pois, é neste âmbito onde deveria incidir a avaliação de desempenho dos professores (destaco: professores). Estas áreas podem dividir-se em três vertentes avaliativas (não vejo outras): cientifica, pedagógica e cumprimento de procedimentos. Ora, nesta última todos se podem avaliar uns aos outros. Mas nas outras será necessário, entre diversas coisas, que os avaliadores tenham um grau académico igual ou superior ao avaliado, na correspondente vertente e na correspondente especialidade. Caso contrário a acreditação académica das universidades deixa de ter qualquer sentido e, embaraçosamente, os avaliadores também não terão “bagagem” cultural e ética para contrariar o avaliado ou podê-lo classificar. Por exemplo: como pode um professor, que só teve a profissionalização em serviço (uma formação pró-forma), avaliar pedagogicamente outro que, além de possuir um curso vocacionado para a profissão docente, tem também um mestrado em ciências da educação? Simplesmente ridículo! E isto não será um caso isolado, irá acontecer em muitas escolas.
O que será isso de ser bom professor? Aos olhos dos EE serão uns, talvez os mais simpáticos ou os que atribuíram melhores classificações aos seus educandos, mas aos olhos do pedagogo romântico serão outros, talvez os que cumpriram o plano da aula ou os que dinamizaram uma visita de estudo. Imaginem o que seria avaliar o desempenho de um ministro. Imaginem a divergência e quantidade de opiniões que conseguiríamos obter sobre, por exemplo, a ministra Maria de Lurdes. Teríamos sempre classificações que vão desde o muito mau até ao excelente. Nós temos um trabalho parecido em termos de envolvência. Não despegamos às 18 e muito menos fabricamos sapatos. Conseguem de certeza classificar de excelente aquele que nunca esteve doente e que nunca faltou, ou aquele que entregou dentro do prazo todos os “papéizitos solicitados pelo chefe”, mas nunca conseguirão saber se é bom professor mesmo que voluntariosamente se pretenda obter alguma coisa com a observação de 2 ou 3 aulas (1).
A avaliação de desempenho docente também não poderia continuar como era feita até aqui, pois baseava-se em opiniões podendo facilmente favorecer-se os “amigos” e prejudicar os “inimigos”. Mas, agora, com itens de avaliação do tipo “empenhamento e qualidade” (dois critérios distintos e juntos no mesmo “saco”), voltamos ao mesmo, ou seja, voltamos à incongruência da avaliação baseada em opiniões. Facilmente se constatará que todos os nossos amigos terão um excelente empenho e uma excelente qualidade. Parece-me que a melhor metodologia, em vez de ser imposta por pessoas que não respiram na escola, seria ouvir os que “vivem lá dentro” com uma pergunta tão simples como esta: como querem ser avaliados? (É tão linda a transparência e a humildade).
Outra das incompreensões destes aparentes ataques à classe docente surge quando pretendem obrigar os professores a fazer um exame depois de concluírem um curso, que foi objectivamente direccionado para a profissão, antes de se iniciarem na realidade do trabalho. Deduz-se deste modo uma de duas coisas: que as nossas universidades, e seus professores, não têm qualidade (o que é lastimável para os senhores professores doutores) ou então que o estado não as consegue controlar. Arrisco-me a dizer, pelo que tenho observado, que a selecção dos professores se faz naturalmente. Os que não aguentam a pressão (que a há) ou os que não se adaptam (que os há) saem e mudam de caminho sem “ninguém” os forçar.
Não seria necessário mostrar ao público que as instituições do estado, criadas e promovidas por ele, não são de confiança.


(1) Ver texto do mês anterior nesta revista: “Aulas assistidas? Está aberta a época do teatro” http://www.revistaensinareaprender.blogspot.com/2008/02/ao-aulas-assistidas-est-aberta-poca-do.html


Luís Filipe Firmino Ricardo (2008)

(AO) Os cursos cef's, pief's e o entusiasmo educativo

Uma crítica ao facilitismo existente para obtenção de certificados CEF dissimulado pelo acréscimo de competências (que não existem) dos professores

No jornal Expresso de 8-12-2007 vem publicado excertos da carta aberta que o professor Domingues Freire Cardoso escreveu ao Presidente da República. O que ele escreve é certeiro, certeiríssimo. De facto, os Cursos de Educação e Formação (CEF) ministrados nas nossas escolas servem efectivamente para muito pouco. Para além de contribuírem positivamente para as estatísticas do ministério (para as apresentar como bandeira eleitoral), os cursos CEF, PIEF (Programa Integrado de Educação e Formação) e outras siglas afins vêm demonstrar o que paira nas cabeças dos nossos governantes desde há muitos anos a esta parte, com especial destaque para o actual executivo.Neste sentido, considero modelar uma frase de Ana Benavente ao jornal Público (não sei precisar a data) em que ela refere que para a assunção do combate ao défice não era necessário colocar a cabeça dos professores no pelourinho (os termos poderiam não ter sido estes mas a semântica é correcta). Ora este tipo de ensino em que o enfoque reside na facilidade com que os alunos que frequentam estes cursos podem alcançar os objectivos a que se propõem (facilidade que não é obviamente declarada mas é intuitivamente assimilada), não é mais do que a colocação do professor não no pelourinho mas no cadafalso. Convém nunca esquecer que não é só o aluno que está no centro do processo educativo. E sem dignidade não existe futuro.
Lurdes Rodrigues e outros como ela não são capazes de compreender que a educação, numa realizada interacção pedagógico-didáctica, continua a ser um professor numa sala de aulas a transmitir conhecimentos aos alunos. É tão simples quanto isso. O que está para além disso é já outra coisa.

José E. F. Ricardo

(AO) “Artigo 22º ”

Uma análise crítica ao Artº 22 do Estatuto do Aluno

Já alguém lhe chamou a “torrente legislativa” do Ministério da Educação, e como todas as torrentes arrasta consigo tudo em que toca, não sendo aqui os alunos uma excepção! Talvez por se encontrar envolvida nesta volumosa corrente, a Lei 3/2008 - o Estatuto do Aluno dos Ensinos Básico e Secundário - não tem suscitado neste momento a atenção dos media e, estranhamente na minha opinião, nem mesmo das associações de pais. É preocupante que dela não se fale, nem que o artigo 22º nela contido não seja alvo de análise!
Diz número 2 do referido artigo que “sempre que um aluno, independentemente da natureza das faltas, atinja um número total de faltas correspondente a três semanas no 1.º ciclo do ensino básico, ou ao triplo de tempos lectivos semanais, por disciplina, nos 2.º e 3.º ciclos no ensino básico, no ensino secundário e no ensino recorrente, ou, tratando-se, exclusivamente, de faltas injustificadas, duas semanas no 1.º ciclo do ensino básico ou o dobro de tempos lectivos semanais, por disciplina, nos restantes ciclos e níveis de ensino, deve realizar, logo que avaliados os efeitos da aplicação das medidas correctivas referidas no número anterior, uma prova de recuperação, na disciplina ou disciplinas em que ultrapassou aquele limite, competindo ao conselho pedagógico fixar os termos dessa realização”.
É certo que neste País quase sempre se aceitavam as justificações dos pais sem grandes questões, que meninos havia que viam os seus longos sonos e faltas de vontade premiados com umas boas justificações de “dores de barriga e afins” e que urgia terminar com tais logros…de que eram cúmplices pais, professores e outros profissionais bem intencionados. Mas, como de boas intenções sempre o inferno esteve cheio…
No entanto este artigo levanta algo mais complexo – por um lado começa por penalizar todos aqueles que faltam justificadamente. Por doença, mesmo que infecto-contagiosa, internamento hospitalar por morte de familiar, enfim…! Mas não percamos a esperança, pois, depois dessas infelizes circunstâncias vai o aluno poder mostrar o que vale numa prova de recuperação.
Mas, o que oferece a escola de forma a proporcionar essa recuperação? Que apoio lhe é fornecido? E isto porque acredito que, ao se verificarem circunstâncias de tal índole, não irá nenhum Conselho de Turma aplicar as medidas correctivas que estão também previstas no artigo 26º. Assim as medidas a aplicar ficarão apenas pela execução da referida prova nas disciplinas em que seja requerida.
A escola não oferece, pouco ou nada tem para oferecer. Apoios para poucos, salas de estudo inexistentes, apenas em algumas disciplinas….todos conhecemos estes factos. Estes alunos não serão também os nossos filhos?...
Mas, o mais inquietante não fica por aqui. Este artigo levanta outras questões, coisinhas de pouca monta como por exemplo as referentes às (esquecidas) áreas curriculares não disciplinares.
Sem programa formal nem conteúdos a leccionar, levanta-se a questão da execução do teste de recuperação a aplicar a estes alunos, “de forma a permitir com a aprovação do aluno na prova prevista no n.º 2 ou naquela a que se refere a alínea a) do n.º 3, que o mesmo retome o seu percurso escolar normal, sem prejuízo do que vier a ser decidido pela escola, em termos estritamente administrativos, relativamente ao número de faltas consideradas injustificadas”. Pois bem nestas áreas a situação a situação está longe de ser resolvida, dada a impossibilidade de realização da dita prova… e, está bem claro que ainda não se percebeu bem o impacto de tais medidas no dia a dia escolar, deixem-me refrasear, no dia e noite escolar. Sim porque depois de substituições, reuniões, planificações e, enfim um período normal de aulas diárias – ainda conseguimos fazer isso – teremos pela frente um sem fim de reuniões para decidir sanções disciplinares, realização de testes, medidas a tomar após os testes, decidir sobre a justificação das referidas faltas….
Enfim, será que alguém pensou se tal seria humanamente exequível?

M. Manuela Gomes
Professora do Grupo 520

(AC) O lado oculto dos professores não-efectivos

Conclusões de um estudo sobre as razões da (não-)participação destes professores

A dissertação de mestrado que elaborei (Ricardo, 2006) foi dedicada à participação dos professores não-efectivos numa determinada Escola secundária nas actividades que animam o Projecto Educativo de Escola (PEE). A sua pertinência poderá justificar-se através da elevada percentagem (30%) de professores não-efectivos existente representando uma enorme fatia no que respeita à animação de toda a vida escolar. São também “sempre os mesmos” levando-me a ter a pretensão de inferir os resultados para a generalidade dos professores não-efectivos, pois, como eles próprios referiram, “os problemas não se alteram ano após ano”. A participação que se abordou foi a que envolveu, efectivamente, esses professores nas acções. Excluiu-se assim a participação nas tomadas de decisão ou a participação de corpo presente (fazer-se parte) de um órgão. Teve como objectivo principal tentar encontrar as causas e as motivações que os leva a envolverem-se nas actividades do Plano Anual de Actividades (PAA). Tentei perceber deste modo as motivações, o grau de envolvimento, assim como as razões evocadas por esses professores. Procurei ainda saber se nas actividades propostas existia a necessária coerência entre o PEE e o PAA.
Encontrei 12 razões que explicaram a “participação” e 28 razões a “não-participação”. A participação foi justificada por:
(1) possibilidade de se contabilizarem aulas através dessa participação (cursos profissionais);
(2) “baixo rendimento dos alunos” permitindo que estes se interessem por outros motivos pois “só desta maneira é que mostram alguma alegria”;
(3) aproximação aluno-professor criando-se uma espécie de tréguas;
(4) “fuga às aulas” no sentido de descompressão;
(5) gosto pessoal que têm em algumas particulares actividades;
(6) sociabilidade que permite cimentando amizades recentes e “optimiza o clima”;
(7) existir alguma ligação afectiva à Escola;
(8) pedido que lhes é dirigido por parte dos colegas, solicitando-lhes ajuda, com frases do tipo “só participo se me convidarem”;
(9) “existir algum interesse para os alunos, caso contrário, não participo”;
(10) disponibilidade de tempo, pois alguns encontram-se fora de casa durante toda a semana, “ajuda a passar o tempo”;
(11) facilitar no que respeita ao cumprimento dos conteúdos programáticos, pois só conseguem leccionar uma “determinada matéria em actividades fora de aulas, de outro modo não consigo”;
(12) à “realização profissional” numa atitude de carácter ético.
Por outro lado, a não-participação justificou-se por:
(1) não se considerarem “(…) pertença da Escola (…), estou de passagem”, fazendo com que não exista qualquer ligação afectiva;
(2) indisciplina e desinteresse dos alunos;
(3) instabilidade profissional;
(4) dúvidas levantadas sobre como o fazer em termos organizacionais dentro de cada departamento;
(5) mal-estar provocado pelas exigências das novas tarefas emanadas pela recente legislação;
(6) falta de tempo provocada com estas novas obrigações;
(7) falta de tempo devido aos níveis exigentes que lecciona, pois os “programas não contemplam o tempo que se despenderia nessas actividades”;
(8) falta de tempo para a família;
(9) distância a casa provocando um “desgaste extra”;
(10) mal-estar provocado por uma remuneração inadequada face “à importância do trabalho que desenvolvo comparativamente a outros sem tanto relevo”;
(11) horários incompatíveis entre colegas de um eventual projecto impossibilitando o trabalho em equipa;
(12) mau horário lectivo;
(13) falta de locais sossegados na Escola;
(14) clima relacional entre os professores não ser considerado o adequado;
(15) falta de recursos materiais;
(16) burocracia que essas actividades acarretam para as levar a efeito;
(17) aulas que perderiam contrariando os compromissos de cumprirem os conteúdos programáticos;
(18) muito trabalho que já têm na Escola;
(19) departamento onde estão integrados ser considerado “sossegado” onde “não é exigida participação (...) e não vou ser eu a ter essa iniciativa”;
(20) falta de divulgação das actividades;
(21) dificuldade em integrar-se nas relações sociais da Escola;
(22) consideração que fazem sobre os órgãos de administração e gestão quando dizem “que não conseguem impor ordem e disciplina nos alunos”;
(23) má situação profissional em que se encontram;
(24) colocação tardia na Escola;
(25) terem feito propostas de actividades e o departamento não as ter inserido por dúvidas levantadas sobre a sua operacionalidade;
(26) comparação que fazem com outros colegas, pois “se eles não participam, não vou ser eu a participar”;
(27) não lhes é solicitado, pois “ninguém me pede nada”;
(28) ineficácia produtiva de algumas actividades, não dando qualquer “gozo”.
De realçar que, maioritariamente, as razões mais fortes para justificar a participação e a não-participação foram, respectivamente, as quatro primeiras e as três primeiras razões.
Assim, pode-se considerar que os professores não-efectivos não participam nas actividades do PAA sendo que as motivações extrínsecas são mais determinantes que as intrínsecas no que respeita à participação. No entanto, existe uma pequena minoria que participa sem esperar receber qualquer recompensa material. Nesta problemática da participação, e apesar de se constatar que quando se planeia uma qualquer actividade não é verificada a coerência com o PEE, algumas conseguem enquadrar-se nesse projecto global, não sendo difícil obter-se uma relação para que essa inclusão seja conseguida.
Em jeito de descobertas marginais, constatou-se que a indisciplina dos alunos e o aparente desinteresse destes, estão na base de grande parte do mal-estar docente. A distância a casa surge como um factor importante no que respeita à não participação e também, em menor grau, à participação. Surge, ainda, como um factor de desmotivação para todas as funções docentes.
Outro dos aspectos, que se verifica não existir, é a formação de apoio face aos novos paradigmas: formação ao nível da planificação e avaliação de projectos, ao nível administrativo (de forma a saber-se estar nos órgãos colegiais através da clarificação das suas competências) e ao nível de saber lidar com a indisciplina dos alunos. A este respeito e numa lógica de “poupar” os professores, os processos disciplinares também têm de ser mais céleres de modo a não se arrastarem por reuniões infindáveis. Parece-me que enquanto os professores ocuparem o seu tempo com irracionalidades burocráticas não se dedicarão a outras actividades que lhes dão mais gozo e que mais valorizam, como por exemplo, preparar e dar aulas. Falta também uma maior atribuição de responsabilidade. Exagera-se na tal irracionalidade burocrática quando qualquer decisão de menor importância tem de passar por vários órgãos a fim de ser ratificada. É necessário dar mais “voz” aos professores não-efectivos e aproveitar todo o seu potencial de conhecimento adquirido com a experiência da passagem por inúmeras escolas. Conhecem as virtudes e os defeitos dos outros. Têm uma visão liberta da actual escola apercebendo-se melhor das “rachadelas na parede” que “os da casa” ignoram ou não conseguem ver. A grande maioria não vive na cidade onde trabalha devendo haver alguma compreensão no que respeita à distribuição de horários e tarefas, pois, têm os salários mais baixos da Europa não lhes permitindo fazer grandes e/ou muitas viagens.

Referência bibliográfica
· RICARDO, Luís - A Participação Obrigatória na Escola – Perspectiva do Professor Não-efectivo. Porto: Universidade Portucalense (diss. mestrado policopiada), 2006


Luís Filipe Firmino Ricardo (2008)