Uma reflexão sobre a contribuição da Investigação Ação para a sustentabilidade de uma escola eficaz salientando-se as vantagens que existem na proximidade do professor/investigador ao objeto de estudo
Muitas das soluções propostas por vários autores são apresentadas através de modelos em que “os professores são vistos como simples consumidores” (Zeichner, 1993, p. 17). Este autor alerta ainda para se “ter em atenção as investigações feitas por terceiros” (idem, p. 27) no sentido de lhes atribuir alguma desconfiança “Caso contrário, estará se repetindo o mesmo erro do passado, ao se deixar que outros, as classes dirigentes, façam as leituras do mundo e as transmitam como sendo verdade” (Grabauska & Bastos, 1998, p.4).
As soluções estandardizadas como forma de indicação para o exercício da profissão docente poderão, quando muito, orientar-nos para um determinado caminho mas muito dificilmente nos guiarão até a uma solução satisfatória. Contrariando esta tendência a Investigação Ação (I-A) permite uma maior eficiência no trabalho pedagógico através da diversificação de estudos e reformulação de práticas. Tendo em conta também a diversidade dos sujeitos com que o docente se confronta, a I-A, num contínuo processo de melhoramento da prática, pode levar o profissional a um maior envolvimento podendo, naturalmente, resultar em mais motivação no trabalho. O conhecimento produzido pelos próprios profissionais (embora se reconheça que o principal objetivo da I-A é a melhoria da prática e não a produção de conhecimento) e a “progressiva aceitação desse reconhecimento no âmbito do sistema educativo em geral seria certamente vantajosa para a afirmação da profissionalidade docente” (Sousa, 2010, p. 35) refletindo-se numa maior satisfação no trabalho e consequentemente num melhor clima e eficácia escolar. Também Zeichener e Noffke (2001, cit. Freire, 2007) destacam inequivocamente a importância que a produção de conhecimento através da prática possui. Um outro apontamento apresentado por Ludke e Cruz (2005, cit. Sousa, 2010, p. 46) que poderá incentivar e catapultar a I-A como uma prática essencial junto dos professores:
“temos de reconhecer a falta de produtividade, ou mesmo de alcance de pesquisa universitária junto à escola básica e a evidência de que os professores dessa escola estão mais habilitados para perceber melhor os problemas que afligem esse nível de ensino”.
A I-A vista como um meio eficaz na sustentabilidade da qualidade das escolas produz assim
“sentimentos positivos face ao ensino e ao ser-se professor (…) sentimento da importância social do trabalho nas escolas, a crença (…) nas suas capacidades intelectuais e na importância do seu desenvolvimento para melhorar o desempenho profissional, o reforço das relações afectivas entre colegas” (Máximo-Esteve, 2008, p. 71).
Ainda o texto de Kelchtermans (2009, cit. Gonçalves, 2010, p.21) que salienta a importância das constantes reflexões dos professores:
“(…) os professores tendem a falar espontaneamente do seu trabalho. De facto fazem-no sempre: nas salas de professores, durante os cursos, (…) em festas familiares (…) Sempre que os professores se encontram contam histórias”.
A respeito de “reflexão” e de “professor reflexivo”, palavras-chave da I-A, Zeichner (1993) alerta para o uso vulgarizado dos termos. Critica a forma como se usa o conceito de professor reflexivo nas reformas e sugere que os professores são encaminhados a imitarem as práticas vindas de investigações a que eles não tiveram uma contribuição negligenciando-se os conhecimentos vindos das suas práticas. Acrescenta que “Um exemplo desta tendência é a avaliação dos professores, segundo modelos externos alegadamente baseados na investigação” (idem, p. 22). Considera que os termos surgiram como uma reação ao facto de se considerarem os professores como funcionários, cumprindo ordens, e não como agentes ativos na formulação das soluções para os problemas de ensino. Também Teodoro (2006) destaca esta tendência. Contrariando este pendor, Zeichner (1993, p.16), refere que “os professores são profissionais que devem desempenhar um papel activo na formulação tantos dos propósitos e objectivos do seu trabalho, como dos meios para os atingir” (idem, p. 16). E continuando diz mesmo que
“Reflexão também significa o reconhecimento de que a produção de conhecimento sobre o que é um ensino de qualidade não é propriedade exclusiva das universidades e centros de investigação e desenvolvimento e de que os professores têm teorias que podem contribuir para uma base codificada de conhecimentos do ensino (…) é bastante claro que a melhoria das escolas não pode depender só dos conhecimentos produzidos nas universidades” (ibidem).
Concluo este apontamento, sobre as dúvidas que normalmente se levantam à excessiva proximidade do professor/investigador com o objeto de estudo, apresentando uma exposição de Hameline (1991): alguns professores passam a teses de doutoramento as suas reflexões sistemáticas. A metáfora conhecida por “Janela de Johari” proposta por Luft e Hingham (cit. Carmo & Ferreira, 1998, p.110) descreve que o acesso à “área secreta” fica facilitada enquanto a observação da “área cega” fica dificultada sugerindo que existem vantagens e desvantagens nessa proximidade. Mas, fazendo-se a contabilidade dessa vizinhança em relação à distância, o saldo parece-me francamente positivo para o lado do professor/investigador.
Referências bibliográficas
Carmo, H., & Ferreira, M. (1998). Metodologia da Investigação - Guia para Auto-aprendizagem. Lisboa: Universidade AbertaFreire, A. M. (2007). Educação para a Sustentabilidade: Implicações para o Currículo Escolar e para a Formação de Professores. Lisboa: Universidade de Lisboa, Centro de Investigação em Investigação, Pesquisa em Educação Ambiental, v.2, nº1, pp-141-154
· Gonçalves, J. (2010). Supervisão e Avaliação: construção de registos e relatórios. Aveiro: Universidade de Aveiro
· Grabauska, C. J., & Bastos, F. P. (1998). Investigação-acção: possibilidade crítica e emancipatória na prática educativa. Revista Electrónica de Investigación Curricular y Educativa, v. 1, n. 2
· Hameline, D. (1991). “O educador e a acção sensata” in Nóvoa, A. (org.) (1991). Profissão Professores. Porto: Porto Editora, pp.32-61
· Máximo-Esteves, L. (2008). Visão Panorâmica da Investigação-Acção. Porto: Porto Editora
· Sousa, F. (2010). A Investigação enquanto prática de deliberação curricular: o caso do projecto ICR. Ponta Delgada: Universidade dos Açores, Revista Interacções, nº 14, pp.32-56
· Teodoro, A. (2006). Professores para quê? Mudanças e desafios na Profissão docente. Porto, Profedições
· Zeichener, K. (1993). A formação reflexiva de professores: ideias e práticas. Lisboa: Educa
Luís F. F. Ricardo