(AC) Projectos Sociais nas Escolas

Resumo: A necessidade de mudança no paradigma de escola é um dos assuntos da agenda política um pouco por todo o mundo; relatórios e estudos internacionais dão conta da necessidade de desenvolvimento de competências sócio - emocionais nos alunos como forma de colmatar os deficits estruturais que a comunidade parece ser incapaz de suprir. Neste contexto, a presença de educadores sociais nas escolas constitui hoje uma necessidade, numa lógica de multidisciplinaridade e promoção de uma escola mais justa, porque mais equitativa e inclusiva.

Palavras-Chave: paradigma escolar; educação social nas escolas; equidade.
Durante o século passado e muito por força de um modelo de racionalidade positivista e instrumental (Habermas, 1991), a escola centrou-se mais no desenvolvimento cognitivo do aluno do que na promoção e desenvolvimento integral da pessoa. Porém, os estudos de Goleman (1995) e Damásio (1994, 1999, 2003) demonstraram a importância e necessidade de desenvolvimento de competências sócio - emocionais nas crianças e jovens por serem determinantes em grande medida, quer do seu sucesso cognitivo e académico, quer da qualidade das interacções sociais que conseguem estabelecer.
Por outro lado, segundo dados da EU (SEC, 2007), cerca de 15% das crianças europeias abandona precocemente a escola e apenas 77% dos jovens até aos 22 anos completam o ensino secundário. Em Portugal, como sabemos, os dados disponíveis são ainda mais dramáticos uma vez que há apenas dez anos atrás, apenas 66% dos jovens portugueses concluíam o ensino secundário.
Note-se que o mesmo relatório aponta também vantagens ao desenvolvimento de competências pessoais e sociais na escola como forma de colmatar os crescentes deficits nestas áreas. Destaca ainda a importância e necessidade de programas que permitam minorar os efeitos escolares decorrentes das desigualdades económico-sociais de origem das crianças; é reconhecido que uma criança pobre têm menor probabilidade de ser bem sucedidas no seu percurso escolar, gozar de boa saúde e integrar o mercado de trabalho. A pobreza, que em muitos estados afecta quase uma em cada três crianças em idade escolar, tem impacto no seu desenvolvimento emocional, social e cognitivo, e portanto no seu desempenho académico (muito em particular no abandono precoce da escola).
No âmbito destas preocupações, a OCDE (1994) define a qualidade educativa como aquela que «assegura a todos os jovens a aquisição dos conhecimentos, capacidades, destrezas e atitudes necessárias para a vida adulta». Dentro desta linha de orientação, urge repensar a equidade como cerne de uma mudança educativa que se insinua já nos discursos, mas que não é em muitos casos assumida ou sequer consciencializada, pela generalidade da comunidade educativa. Ainda no âmbito das teorias sobre equidade, a teoria política de Rawls (2003) merece-nos um destaque especial; com efeito, segundo este autor, uma escola promotora da equidade teria que ter como base da sua actuação pedagógica uma política compensatória das diferenças e desigualdades de origem dos seus alunos. Dar mais a quem mais precisa, poderia muito bem ser o lema desta nova atitude na escola.
Naturalmente que a adopção deste princípio teórico implica mudanças, nomeadamente a nível do conhecimento a ter dos alunos, das suas potencialidades e dificuldades, do contexto familiar em que vive e que determina grande parte da sua postura de maior ou menor desinteresse pela escola, do seu equilíbrio emocional e consequentemente do seu comportamento quer entre pares, quer na sala de aula.
Implica ainda que a escola enquanto organização complexa se interrogue sobre as dificuldades de gestão social das interacções mantidas entre os professores e os alunos, bem como dos alunos entre si. E numa sociedade cada vez mais deficitária em termos de apoio familiar e comunitário aos jovens, a escola não pode nem deve fechar os olhos a esta realidade, afirmando simplesmente que a sua missão é ensinar, ignorando as dificuldades sistémicas dos seus alunos, em função dos quais (convém não esquecer) foi pensada e mantém até hoje a sua razão de ser.
Porventura essa missão, historicamente associada à formação de elites sociais, encontra-se actualmente desajustada às novas realidades criadas com o declínio dos modelos sociais e económicos do século XX. Nunca como hoje a coesão social foi tão deficitária. Nunca como hoje, as desigualdades sociais foram tão visíveis na escola.
De acordo com Barroso (2002), é necessário repensar a escola no quadro deste novo milénio, nomeadamente a sua estrutura organizativa e funcional; a assumpção da sua plurifuncionalidade socioeducativa, deverá ser equacionada, segundo este autor, a partir de quatro vectores: a) enquanto serviço local do Estado, a escola pública deve cumprir a sua missão educativa dentro dos princípios constitucionais democráticos; b) enquanto organização de profissionais, a escola deve assegurar uma relação pedagógica assente na confiança mútua entre professores, alunos e respectivas famílias; c) enquanto serviço público de solidariedade social, a escola deve assegurar formas de apoio adequadas às diversas necessidades dos alunos e finalmente, d) enquanto membros de uma comunidade local, a escola deve ser capaz de expressar os interesses da colectividade que serve.
É neste quadro que se justifica a existência de Projectos Sociais nas escolas, enquanto forma de reforço dos laços de proximidade com a comunidade local, cuja parceria estratégica deve ser orientada em função do seu contributo para minorar alguns dos deficits sociais dos seus alunos e respectivas famílias. Estes projectos permitirão, desenvolver nas escolas uma ‘política de solidariedade em proximidade’ (Barroso, 2006), sem a qual será muito mais difícil inverter a tendência para a exclusão de que são alvo muitos dos alunos que a frequentam.
Com efeito, a escola do século XXI é palco de inúmeras assimetrias; coexistem lado a lado práticas pedagógicas diversas, diferentes modos de interacção, formas de assumpção do poder igualmente díspares. Neste contexto, a escola não difere do tecido social que a envolve e ao qual tende muitas vezes a reagir ignorando esta similaridade de padrões de interacção e de poder.
Esta crescente complexidade das interacções permite-nos perceber a importância de um espaço de mediação de conflitos, no qual seja possível aos alunos e respectivas famílias cruzar os seus pontos de vista com pontos de vista contrários e desta forma contribuir para a promoção de uma maior justiça social nesta micro sociedade que é a escola. Convém não esquecer que o conflito faz parte integrante da vida; cabe também à escola ensinar a lidar com ele de forma positiva, permitindo aos envolvidos reflectir sobre as suas práticas e crescer do ponto de vista pessoal. A existência deste espaço de reflexão e diálogo é essencial à construção de uma sociedade mais democrática e justa, tal como é afirmado na Declaração de Barcelona (2001, in Dias de Carvalho e Baptista, 2004) em cujos princípios é reconhecida a importância da «promoção social activa das pessoas, dos grupos e das comunidades, para que compreendam os seus direitos e assumam as suas responsabilidades».
Dentro das exigências colectivas para a educação dos jovens do século XXI, a capacidade das escolas em minorar a condição de jovens em risco (considerando dimensões tão dispares como o insucesso, absentismo e abandono escolares, mas também o apoio em situações de comportamentos desviantes, desagregação dos laços familiares ou conflitos escolares), constitui-se hoje como o grande desafio das consciências. - Que escola queremos? - A quem serve a escola? Estas são algumas das questões a que não podemos deixar de dar resposta. A sua equação constitui-se mesmo como o eixo central de qualquer projecto educativo no quadro da crescente autonomia da escola pública.
É neste contexto que surge a questão da existência de educadores sociais nas escolas; conhecidos como técnicos da relação (Dias de Carvalho e Baptista, 2004) e promotores da construção de identidades e percursos de vida junto de jovens socialmente mais fragilizados, a sua função confunde-se com a edificação de uma sociedade de inclusão assente numa lógica de complementaridade de funções pedagógicas cuja responsabilidade coube até agora exclusivamente aos professores. Ainda de acordo com os autores supracitados «o conceito - chave do trabalho social (...) é o conceito de exclusão. Na realidade, a ideia de exclusão representa, em princípio, a consciencialização de uma sociedade relativamente à extorsão de direitos que ela, defendendo no domínio das convicções ou tão-somente dos discursos, depois rejeita no concreto da sua dinâmica, vitimizando pessoas e grupos. Feito o balanço, constata-se que essa mesma ideia suporta, afinal, a estrutura de uma autêntica sociedade de exclusão».
É esta reflexão que cabe a cada escola fazer. Sem ela a legitimidade de implementação de um Gabinete de Apoio ao Aluno e à Família pode ficar comprometida. Mas o imperativo da sua existência, esse mantêm-se vivo por cada criança que abandona precocemente a escola, por cada criança sem capacidade de construir com apoio familiar, um percurso de vida digno, por cada criança expulsa da sala de aula e em situação de risco escolar!


Referências Bibliográficas:

BARROSO, J. (2002): A investigação sobre a escola: contributos da Administração Educacional. In Investigar em Educação. Revista da Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação, vol I, n.º 1 (7). (p. 277-298).
___________(2006): Incluir sim, mas onde? Para uma reconceituação sóciocomunitária de escola pública. In RODRIGUES, D. (org.). Inclusão e Educação. Doze olhares sobre a educação inclusiva. S. Paulo: Summus ed.
DAMÁSIO, A. (1994): O Erro de Descartes. Lisboa: Publ. Europa-América.
_________ (1999): O Sentimento de Si. O corpo, a emoção e a neurobiologia da consciência. Lisboa: Publ. Europa-América.
_________ (2003): Ao encontro de Espinoza. As emoções sociais e a neurobiologia do sentir. Lisboa: Publ. Europa-América.
DIAS DE CARVALHO, A, BAPTISTA, I. (2004): Educação Social, Fundamentos e Estratégias. Porto: Porto Editora.
GOLEMAN, D. (1995): Inteligência Emocional. Lisboa: Temas e Debates ed.
HABERMAS, J (1991): Comentários à Ética do Discurso. Lisboa: Instituto Piaget.
OCDE (1994): La qualité de l’ enseigemment. Paris: CERI.
RAWLS, J. (2003): Uma teoria da Justiça. Lisboa: Ed. Presença
SEC (2007) Commission of the European Communities. Relatório 1483 final. Consultado em 10.04.08 em http://www.anacom.pt/
Isilda Pereira e Silva (2009)

NOTÍCIAS

“Nove em cada dez alunos do 4.º ano teve nota positiva nas provas de aferição de Língua Portuguesa e de Matemática. Os do 6.º também chegam aos 90 por cento na Língua Portuguesa, mas é a Matemática que continua a ser o seu calcanhar de Aquiles, com dois em cada dez estudantes com nota negativa”.
Público (19-Junho-09)
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“Na recta final do ano lectivo, Ministério informou as escolas que vai dar formação aos avaliadores e enviar novas fichas de auto-avaliação para os professores. Há estabelecimentos onde a auto-avaliação já esta feita, e os sindicatos estão "estupefactos". Mas Ministério diz que está a cumprir prazos e que avaliação não terá "qualquer efeito" no próximo ano”.
DN (19-Jun-2009)
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